- ID
- 5522260
- Banca
- CEFET-MG
- Órgão
- CEFET-MG
- Ano
- 2021
- Provas
-
- CEFET-MG - 2021 - CEFET-MG - Assistente em Administração
- CEFET-MG - 2021 - CEFET-MG - Técnico de Laboratório - Área Edificações
- CEFET-MG - 2021 - CEFET-MG - Técnico de Tecnologia da Informação Desenvolvimento de Sistemas
- CEFET-MG - 2021 - CEFET-MG - Técnico de Tecnologia da Informação Infraestrutura de TIC
- CEFET-MG - 2021 - CEFET-MG - Técnico em Enfermagem
- Disciplina
- Português
- Assuntos
A questão refere-se ao texto a seguir.
A praga
Ninguém sabe ao certo como se entenderam, mas se
entenderam. E a primeira coisa que o índio deu a Colombo
foi um tomate. Era o primeiro encontro, na primeira ilha, no
primeiro dia, e o próprio sol parecia ter chegado mais perto
para não perder a cena. Fazia calor e o tomate brilhava ao sol
como uma maçã dourada.
— Um pomo d´oro! — exclamou Colombo.
— Um tomate. — explicou o índio. — Para a salada. Para o
molho.
— Finalmente algo para pôr fim à brancura do espaguete
— disse Colombo emocionado. — Marco Polo só descobriu a
massa. Eu descobri a macarronada.
E Colombo aceitou o tomate e deu em troca uma miçanga.
O índio deu uma batata a Colombo que a olhou com desprezo.
Mas o índio descreveu (com mímica, a linguagem mágica dos
encontros míticos) sua importância para a história ocidental,
desde a alimentação das massas camponesas da Europa até
noisette, ou fritas com um Big Mac. E Colombo a aceitou e deu
em troca um espelhinho.
E o índio deu a Colombo o fruto do cacaueiro e falou no que
o chocolate significaria para o mundo, em especial para a
Bahia e a Suíça, e nas delícias do bombom por vir. E Colombo
guardou o cacau na algibeira e deu em troca um vintém.
E o índio deu a Colombo uma folha de tabaco e falou nos
prazeres do fumo, e de como ele afetaria os hábitos civilizados.
E se quisessem algo mais forte, tinham uma planta que dava
coca, e um barato muito maior. E tudo isso Colombo aceitou em troca de contas. E mais uma espiga de milho. E mais um
papagaio. Até que, com a algibeira cheia, Colombo disse:
— Chega de miudezas. Agora eu quero ouro.
— O quê?
— Ouro. Isso que você tem no nariz.
— E o que você me dá em troca? — perguntou o índio
antevendo algo espetacular como uma luneta. Mas Colombo
apontou uma pistola para a cabeça do índio e disse “isto”.
E disparou. Depois, mandou seus homens recolherem todo o
ouro da ilha, nem que precisassem arrancar narizes.
No chão, antes de morrer, o índio amaldiçoou Colombo e
praguejou. Que a batata tornasse sua raça obesa, que o
chocolate enchesse suas artérias de colesterol, que o fumo lhe
desse câncer, a cocaína o corrompesse e o ouro destruísse sua
alma. E que o tomate — desejou o índio em seu último suspiro
— se transformasse em Ketchup. E assim aconteceu.
Fonte: VERÍSSIMO, L. F. Comédias da vida pública. Porto Alegre: L&PM, 1995.
O título da crônica é textualmente retomado pela