SóProvas


ID
5614111
Banca
FUNDEP (Gestão de Concursos)
Órgão
Prefeitura de Ubá - MG
Ano
2021
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Coronavírus expõe a nossa desinformação sobre a China,

o maior fenômeno econômico dos nossos tempos

Não é a primeira vez que a China passa por uma crise epidêmica. A história das doenças contagiosas que espalham medo é longa. Também é longa a história de como as autoridades chinesas, com seus erros e acertos, contornaram suas próprias crises, como no surto de cólera de 1949 e a varíola em 1950.

A mais recente e marcante epidemia foi a Síndrome Respiratória Aguda Severa, a Sars, na sigla em inglês. Como pontuaram os sinólogos Arthur Kleinman e James Watson, no livro “Sars in China: prelude to pandemic?”, a Sars em 2003 provocou uma das mais sérias crises de saúde de nossos tempos. Kleinman, que tem cinco décadas de experiência em intervenção em saúde pública na China, acredita que a epidemia foi uma espécie de prelúdio de novas catástrofes de saúde que viriam acontecer no século 21. Ainda que o número de mortes tenha sido de aproximadamente 1.000 pessoas — pequeno, comparado a outras epidemias —, a Sars mobilizou inseguranças, medos e preconceitos sobre o país. Os Estados Unidos não pouparam os boatos de que se estaria espalhando bioterror em seu território. O impacto sobre as vidas humanas na China e sobre a economia global foi tremendo, desvelando a fragilidade do mundo globalizado.

Passada a Sars, hoje a notícia do coronavírus se espalha por meio de uma onda de pânico moral que mistura fake news, desinformação, racismo e estereótipos tolos. Notícias falsas gravíssimas percorrem o WhatsApp. A mais debatida nas redes sociais foi a de que o vírus teria tido origem na sopa de morcegos, o que fez com que brasileiros — que vivem no país em que se come coração de galinha e tripa de boi — ficassem escandalizados. Um vídeo no Twitter mostrava uma cena grotesca de um jovem chinês comendo um pássaro vivo, como a prova cabal de que era por isso que o vírus se espalha.

Na apuração de informações para esta coluna, descobri, com a ajuda do professor David Nemer, da Universidade de Virgínia (EUA), que grupos no WhatsApp foram inundados de boatos, em forma de “breaking news”, que diziam que os chineses estavam morrendo caídos nas ruas, que pais abandonaram filhos no aeroporto ao saberem da contaminação e que 23 milhões de pessoas estavam em quarentena e 112 mil haviam morrido. Essa é a narrativa apocalíptica — ou a doutrina do choque, como diria a escritora Naomi Klein — sempre muito bem manipulada para fins políticos.

Tudo isso repete o antigo imaginário euro-estadunidense que procura associar a China à impureza simbólica e concreta. Há pelo menos 30 anos, a imprensa liberal ocidental, quando aborda a produção de manufaturas baratas, recorre sistematicamente à expressão “infestação” do mundo de mercadorias chinesas. Os chineses estão sempre contaminando o mundo de alguma forma.

Tudo isso repete o antigo imaginário euro-estadunidense que procura associar a China à impureza simbólica e concreta. Há pelo menos 30 anos, a imprensa liberal ocidental, quando aborda a produção de manufaturas baratas, recorre sistematicamente à expressão “infestação” do mundo de mercadorias chinesas. Os chineses estão sempre contaminando o mundo de alguma forma. 

É evidente que a manchete do hospital tem uma intenção positiva, que é mostrar uma China dinâmica, com tecnologia de ponta e vontade governamental para resolver seus problemas internos. Mas não deixa de ser o estereótipo do outro extremo, que reatualiza o eterno retorno da mítica chinesa acerca de suas grandiosas construções.

Autores como historiador búlgaro Tzvetan Todorov e o antropólogo francês François Laplantine mostraram que a imagem do Brasil pelos missionários europeus no século 16 era ambivalente: entre o mau e o bom selvagem, paraíso ou inferno. Os maus selvagens eram os indígenas rudes, sem roupa, sem pelo, sem alma. Os bons selvagens eram os nativos de alma pura, que não conheciam a malícia e a maldade.

No caso dos morcegos e desinformação, vê-se um etnocentrismo cru que desumaniza o outro. No caso do hospital, cai-se em idealização também estereotipada.

É importante frisar que não estou fazendo uma crítica a quem compartilhou a notícia. Eu mesma compartilhei. A construção rápida de um hospital mostra pragmatismo diante da calamidade. Além disso, a notícia tem um papel político para se opor à fantasia acerca dos morcegos, que fixam os chineses em um lugar bárbaro e exótico.

O problema, portanto, não é nossa ação individual, mas precisamente o desalentadorfato de que, entre o morcego e o hospital, não sobra quase nada. Caímos sempre na armadilha do dualismo “tradição-modernidade”. Se a gente olha esse debate de longe, estruturalmente, o que concluímos é que não saímos do mesmo lugar de narrativas extremas e caricatas sobre o maior fenômeno econômico mundial dos nossos tempos. Sabemos muito pouco sobre o país mais populoso do mundo, com quase 1,4 bilhão de pessoas. [...]

MACHADO, Rosana. Disponível em: www.theintercept.

com/2020/01/28/coronavirus-desinformacao-china.

Acesso em: 27 out. 2021.

Assinale a alternativa em que o trecho destacado é uma oração adjetiva restritiva. 

Alternativas
Comentários
  • GABARITO

    Tudo isso repete o antigo imaginário euro-estadunidense que procura associar a China à impureza simbólica e concreta.” 

  • Gabarito na alternativa C

    Solicita-se indicação da estrutura composta por oração adjetiva restritiva:

    Para fins de rápida conceituação: orações adjetivas restritivas são orações introduzidas por forma pronominal relativa que, ligadas diretamente a um substantivo ou termo nominal equivalente, cumprem a função de adjunto adnominal, delimitando-lhe o sentido.

    Distingue-se da variante explicativa devido a sua estrutura e função, sendo aquela destacada por vírgulas ou outros sinais de pontuação.

    A) “É evidente que a manchete do hospital tem uma intenção positiva, que é mostrar uma China dinâmica, com tecnologia de ponta e vontade governamental para resolver seus problemas internos.”

    Incorreta. A estrutura destacada é inserta por conjunção integrante, sintaticamente atuando como sujeito do verbo copulativo "é". Estamos diante de oração subordinada substantiva subjetiva;

    B) “Não é a primeira vez que a China passa por uma crise epidêmica.” 

    Incorreta. Consoante alternativa anterior, a passagem destacada é oração subordinada substantiva subjetiva posposta;

    C) Tudo isso repete o antigo imaginário euro-estadunidense que procura associar a China à impureza simbólica e concreta.” 

    Correta. A passagem destacada é encabeçada por pronome relativo que retoma o substantivo imediatamente anterior, delimitando-lhe o sentido. É oração subordinada adjetiva restritiva.

    Percebam que não existe sinal gráfico que separe oração adjetiva e referente, atuando a oração como genuíno adjunto adnominal que restringe o sentido do nome ao qual se relaciona;

    D) “Um vídeo no Twitter mostrava uma cena grotesca de um jovem chinês comendo um pássaro vivo, como a prova cabal de que era por isso que o vírus se espalha.

    Incorreta. A construção destacada é estrutura que completa o sentido de um substantivo deverbal "prova" (provar), sintaticamente oração subordinada substantiva completiva nominal.

  • a) “É evidente que a manchete do hospital tem uma intenção positiva, que é mostrar uma China dinâmica, com tecnologia de ponta e vontade governamental para resolver seus problemas internos.”

    Incorreto. A estrutura em vermelho é uma oração subordinada substantiva subjetiva (exerce função sintática de sujeito, especialmente oracional);

    b) “Não é a primeira vez que a China passa por uma crise epidêmica.” 

    Incorreto. É o mesmo caso do de cima: a estrutura é sujeito oracional (oração subordinada substantiva subjetiva);

    c) Tudo isso repete o antigo imaginário euro-estadunidense que procura associar a China à impureza simbólica e concreta.” 

    Correto. A estrutura destacada em vermelho é uma oração subordinada adjetiva restritiva (não é separada por vírgula) e desempenha a única função sintática que lhe cabe: adjunto adnominal, em específico do núcleo "imaginário";

    d) “Um vídeo no Twitter mostrava uma cena grotesca de um jovem chinês comendo um pássaro vivo, como a prova cabal de que era por isso que o vírus se espalha.”

    Incorreto. A estrutura em vermelho é complemento nominal oracional (oração subordinada substantiva completiva nominal).

    Letra C

  • A questão é de sintaxe e quer que assinalemos a alternativa em que o trecho destacado é uma oração adjetiva restritiva. Vejamos: 

     .

    A) “É evidente que a manchete do hospital tem uma intenção positiva, que é mostrar uma China dinâmica, com tecnologia de ponta e vontade governamental para resolver seus problemas internos.”

    Errado. Há em destaque uma oração subordinada substantiva subjetiva (é evidente "isso" - que a manchete...)

    Oração subordinada substantiva subjetiva: funciona como sujeito do verbo da oração principal.

    Esqueminha:

    1) Verbo de ligação + predicativo + QUE / Verbo de ligação + QUE

    Ex. 1) É preciso que você estude muito. (= É preciso ISSO / ISSO é preciso)

    2) Verbo na voz passiva sintética ou analítica + QUE ou SE

    Ex. 2) Esperava-se que os jogadores ganhassem a competição. (= Esperava-se ISSO / ISSO era esperado)

    3) Verbos unipessoais + QUE

    Ex. 3) Convém que sejamos mais cautelosos. (= Convém ISSO)

     .

    B) “Não é a primeira vez que a China passa por uma crise epidêmica.” 

    Errado. Há em destaque uma oração subordinada substantiva subjetiva (não é a primeira vez "isso" - que a China... / "isso" não é a primeira vez)

     .

    C) Tudo isso repete o antigo imaginário euro-estadunidense que procura associar a China à impureza simbólica e concreta.” 

    Certo. Há em destaque uma oração subordinada adjetiva restritiva (sem vírgula).

    Orações Subordinadas Adjetivas: são as que exercem, como os adjetivos, a função de adjunto adnominal. São iniciadas por pronomes relativos: que, o qual (e variações), onde, quem, cujo (e variações). Podem ser: explicativas e restritivas.

    Oração subordinada adjetiva restritiva: Não é isolada por vírgulas. Restringem ou limitam a significação do termo antecedente, sendo indispensáveis ao sentido da frase.

    Ex.: Os celulares que são modernos custam caro. (somente os celulares que são modernos custam caro)

     

    EXPLICATIVA = Com Vírgula

    RESTRITIVA = Sem Vírgula

     .

    D) “Um vídeo no Twitter mostrava uma cena grotesca de um jovem chinês comendo um pássaro vivo, como a prova cabal de que era por isso que o vírus se espalha.”

    Errado. Há em destaque uma oração subordinada substantiva completiva nominal (como a prova cabal "DISSO" - que era por isso que...)

    Oração subordinada substantiva completiva nominal: funciona como complemento nominal de um termo da oração principal.

    Esqueminha: NOME (advérbio, substantivo ou adjetivo) + preposição + QUE

    Ex.: Ele está certo de que será aprovado. (= Ele está certo de quê? DISSO)

     .

    Gabarito: Letra C

  • Orações adjetivas Restritivas

    Restritivas: Não usa vírgulas(s) e indica ideia de não exclusividade em que se notam dois grupos.  

  • A) ORAÇÃO SUBORDINADA SUBSTANTIVA SUBJETIVA!

    ISSO É EVIDENTE!

    B) ORAÇÃO SUBORDINADA SUBSTANTIVA SUBJETIVA!

    C) "GABIRITO" > PRONOME RELATIVO (OK), CERTO VÍRGULA (OK), ESPECIFICOU O NÚCLEO (OK)

    D) oração subordinada substantiva completiva nominal