O examinador explora, na presente questão, por meio de um estudo de caso, o conhecimento do candidato acerca do que prevê o Código Civil sobre os defeitos no negócio jurídico, importante tema no ordenamento jurídico brasileiro. Senão vejamos:
A Plataforma P2010, localizada na Bacia de Campos, extrai, por dia, o equivalente a 7 milhões de reais em barris de petróleo e seus derivados. Ocorre que, durante um dia em que funcionava com capacidade máxima, uma peça vital para o funcionamento da broca de prospecção parou de funcionar subitamente. A Petrobras, já sabendo dos possíveis danos decorrentes do não funcionamento do citado equipamento, mantinha uma peça sobressalente em sua base operacional em terra, localizada na cidade de Macaé - RJ. No mesmo dia, uma embarcação arrendada pela Petrobras buscou a peça reserva, e os funcionários puderam substituí-la. No entanto, a peça nova apresentou o mesmo problema da anterior substituída, mantendo a produção parada. Após diligente procura, funcionários da Petrobras conseguiram localizar uma peça nova na cidade de Miami – Estados Unidos da América, mas que só poderia ser entregue em 7 (sete) dias úteis, pois a empresa vendedora não dispunha de transporte adequado para fazer o translado da peça imediatamente. Assim, a empresa TRANSPORTEX LINHAS AÉREAS S.A. foi contratada pela Petrobras para que fosse até Miami buscar a peça, uma vez que era das poucas empresas com um avião capaz de realizar o transporte. No entanto, a empresa cobrou o valor de R$500.000,00 (quinhentos mil reais) pelo transporte, quando o preço praticado no mercado é de, no máximo, R$ 80.000,00 (oitenta mil reais).
Analisando o caso hipotético acima, com base no Código Civil, conclui-se que se trata de ocorrência de
A) lesão, e o negócio jurídico é nulo.
B) lesão, e o negócio jurídico é anulável.
Sobre os defeitos do Negócio Jurídico, estabelece o Código Civil:
Dos Defeitos do Negócio Jurídico
Seção I
Do Erro ou Ignorância
Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio.
Art. 139. O erro é substancial quando:
I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais;
II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante;
III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico.
Art. 140. O falso motivo só vicia a declaração de vontade quando expresso como razão determinante.
Art. 141. A transmissão errônea da vontade por meios interpostos é anulável nos mesmos casos em que o é a declaração direta.
Art. 142. O erro de indicação da pessoa ou da coisa, a que se referir a declaração de vontade, não viciará o negócio quando, por seu contexto e pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou pessoa cogitada.
Art. 143. O erro de cálculo apenas autoriza a retificação da declaração de vontade.
Art. 144. O erro não prejudica a validade do negócio jurídico quando a pessoa, a quem a manifestação de vontade se dirige, se oferecer para executá-la na conformidade da vontade real do manifestante.
Seção II
Do Dolo
Art. 145. São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa.
Art. 146. O dolo acidental só obriga à satisfação das perdas e danos, e é acidental quando, a seu despeito, o negócio seria realizado, embora por outro modo.
Art. 147. Nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se teria celebrado.
Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a parte a quem aproveite dele tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou.
Art. 149. O dolo do representante legal de uma das partes só obriga o representado a responder civilmente até a importância do proveito que teve; se, porém, o dolo for do representante convencional, o representado responderá solidariamente com ele por perdas e danos.
Art. 150. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio, ou reclamar indenização.
Seção III
Da Coação
Art. 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.
Parágrafo único. Se disser respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz, com base nas circunstâncias, decidirá se houve coação.
Art. 152. No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela.
Art. 153. Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor reverencial.
Art. 154. Vicia o negócio jurídico a coação exercida por terceiro, se dela tivesse ou devesse ter conhecimento a parte a que aproveite, e esta responderá solidariamente com aquele por perdas e danos.
Art. 155. Subsistirá o negócio jurídico, se a coação decorrer de terceiro, sem que a parte a que aproveite dela tivesse ou devesse ter conhecimento; mas o autor da coação responderá por todas as perdas e danos que houver causado ao coacto.
Seção IV
Do Estado de Perigo
Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa.
Parágrafo único. Tratando-se de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias.
Seção V
Da Lesão
Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.
§ 1º Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico.
§ 2º Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.
Ora, perceba que o enunciado da questão ressaltou que a peça do equipamento é vital ao seu funcionamento, e que a Petrobrás, dada a importância do mesmo, já sabendo dos possíveis danos decorrentes do não funcionamento do citado equipamento, mantinha uma peça sobressalente em sua base operacional em terra, localizada na cidade de Macaé - RJ. Ademais, em razão da urgência e necessidade, mo mesmo dia, uma embarcação arrendada pela Petrobras buscou a peça reserva, e os funcionários puderam substituí-la ao funcionamento do equipamento. Destarte, ocorrendo o mesmo problema com a nova peça, e tendo a empresa TRANSPORTEX LINHAS AÉREAS S.A. contratada pela Petrobras para que fosse até Miami buscar, uma vez que era das poucas empresas com um avião capaz de realizar o transporte, cobrado o valor de R$500.000,00 (quinhentos mil reais) pelo transporte, quando o preço praticado no mercado é de, no máximo, R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), conclui-se que se trata de ocorrência de lesão, que é um vício de consentimento decorrente do abuso praticado em situação de desigualdade de um dos contratantes, por estar justamente sob premente necessidade, ou por inexperiência, visando a protegê-lo, ante o prejuízo sofrido na conclusão do contrato, devido à desproporção existente entre as prestações das duas partes, dispensando-se a verificação do dolo, ou má-fé, da parte que se aproveitou. Na sua base há, portanto, um risco patrimonial decorrente da iminência de sofrer algum dano material.
Por fim, de se registrar que a a lesão inclui-se entre os vícios de consentimento e acarretará a anulabilidade do negócio, permitindo-se, porém, para evitá-la, a oferta de suplemento suficiente, ou, se o favorecido concordar, com a redução da vantagem auferida, aproveitando, assim, o negócio.
C) estado de perigo, e o negócio jurídico pode ser revisto para reduzir a vantagem indevida.
D) estado de perigo, e o negócio jurídico é anulável.
E) estado de necessidade, e o negócio jurídico é nulo.
Gabarito do Professor: B
Bibliografia: