- ID
- 2073787
- Banca
- VUNESP
- Órgão
- Prefeitura de São Paulo - SP
- Ano
- 2014
- Provas
- Disciplina
- Português
- Assuntos
Cheguei domingo às oito da manhã, pé ante pé para não
acordar minha mulher. Apesar do voo, que saíra de Manaus às
três da madrugada, estava disposto: havia dormido algumas horas
no barco-escola e durante toda a viagem, até aterrissarmos
em São Paulo.
Desfiz a mala, providência adotada desde que comecei a
viajar feito cigano e sem a qual não sinto haver chegado a lugar
nenhum, e fui correr no Minhocão.
“Alegria de paulista”, disse uma amiga carioca, quando contei
que aproveitava a interdição do tráfego aos domingos para
correr na pista elevada que faz parte da ligação leste-oeste da
cidade, excrescência do urbanismo paulistano acessível a quinhentos
metros de casa, no centro.
Minha amiga tem razão, talvez seja programa de quem vive
numa cidade cinzenta, congestionada, gigantesca, na qual, para
enxergar uma nesga de céu, é preciso correr risco de morte debruçado
na janela. Compreendo o encanto de morar em meio a
paisagens paradisíacas ou em cidades bucólicas onde todos se
conhecem, mas para os neuróticos, fascinados pela velocidade
do cotidiano, pelo convívio com a diversidade étnica e com as
manifestações de criatividade que emergem nos aglomerados
humanos, correr domingo de manhãzinha na altura do segundo
andar dos prédios da avenida São João é um prazer.
No interior dos apartamentos, o olhar bisbilhoteiro entrevê
mobílias escuras, guarda-roupas pesados, estantes improvisadas
e, claro, o televisor.
Duvido que exista paisagem dominical mais urbana. A mulher
de camisola florida e cabelo desgrenhado abre a cortina e
boceja, despudorada; o senhor de pijama leva a gaiola do passarinho
para o terraço espremido; o homem de abdômen avantajado
escova os dentes distraído na janela. Havia planejado
completar vinte e quatro quilômetros, mas, depois de percorrer
seis vezes os três quilômetros de extensão, sucumbi ao peso da
noite mal-dormida. Tomei água de coco, comprei pão e subi pela
escada até o décimo quarto andar do prédio onde moro, exercí-
cio aprendido com um de meus pacientes, que aos setenta e seis
anos subia dez vezes por dia doze andares. E, não satisfeito com
a intensidade do esforço, fazia-o vestido com um blusão repleto
de bolsos, nos quais distribuía vinte quilos de chumbo.
(O Médico Doente, Drauzio Varella, Companhia das Letras. Adaptado)
Para responder à questão, considere o trecho
– “Alegria de paulista”, disse uma amiga carioca, quando
contei que aproveitava a interdição do tráfego aos domingos
para correr na pista elevada que faz parte da ligação leste-oeste
da cidade, excrescência do urbanismo paulistano, acessível a
quinhentos metros de casa, no centro. (3.º parágrafo)
As expressões em destaque indicam, correta e respectivamente, ideia de