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ID
2719765
Banca
CESPE / CEBRASPE
Órgão
IFF
Ano
2018
Provas
Disciplina
Psicologia
Assuntos

Caso clínico 6A1AAA


Mônica, mãe de Cícero, com quinze anos de idade, compareceu ao atendimento psicológico em um centro de referência para atendimento interdisciplinar de adolescentes queixando-se da falta de respeito, da desobediência, da agressividade e do mau comportamento do filho. Informou que desconfiava que o filho estivesse fazendo uso de droga e que já tivesse iniciado sua vida sexual. Ela disse: “Não sei o que faço. Desde que nasceu, sou sozinha com esse menino. Parei tudo para cuidar dele. O pai nunca apareceu; sumiu quando contei para ele da gravidez. Desde cedo deu problema na escola. Demorou para ler e escrever. Era agitado demais; não parava quieto; incomodava todo mundo. Com cinco anos de idade ele foi diagnosticado com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade e chegou a tomar remédio por quase cinco anos. Vi pouca melhora, mas ele conseguia passar de ano. Agora, de uns tempos para cá, só pensa em ficar na rua e em meninas. Quando o vejo com os amigos, é um outro Cícero. Não se parece em nada com aquele lá de casa. Descobri que está vendo vídeos de sexo proibidos para sua idade na Internet. Quase não deixo ele sair com medo de que ele apronte. Cheiro ele toda vez que volta da rua ou da escola. Um dia desses encontrei um cigarro na mochila dele. Não sei mais o que faço. Não tenho ninguém. Só tenho ele, e ele, só a mim” (sic).


Considerando o caso clínico 6A1AAA e as contribuições psicanalíticas, piagetianas e o processo de adolescência, julgue os itens a seguir.


I A avaliação do processo de adolescer de Cícero deverá levar em consideração os aspectos individuais, culturais, sociais e o histórico desde o qual se manifesta.

II De acordo com as concepções psicanalíticas, a constituição do esquema corporal de Cícero é efeito intrapsíquico da realidade vivenciada por ele.

III Cícero adota uma identidade ocasional quando está na presença de amigos, o que pode ser explicado por uma possível situação de segurança e autonomia que o grupo provoca nele.

IV De acordo com as contribuições piagetianas, Cícero encontra-se no período das operações formais, apesar de não ter adquirido todos os instrumentos lógicos necessários para enfrentar a vida adulta.


Estão certos apenas os itens

Alternativas
Comentários
  • A adolescência é considerada pela psicanálise como um processo crucial na construção da subjetividade. Implica num trabalho subjetivo que envolve o re-conhecimento do corpo, das relações familiares e so- ciais, das possibilidades de ação no contexto social, e tudo isto conduz o adolescente a um reposicionamento em relação à alteridade.

    Durante boa parte da vida, na melhor das hipóteses, o sujeito tentará igualar seu eu ao eu ideal veiculado pelas pessoas importantes de sua vida. É desta forma que o desejo do Outro é veiculado na subjetividade.

    Em suas formulações sobre o imaginário Lacan sempre incluiu a função do simbólico, e no estádio do espelho está presente o olhar daquele que ocupa o lugar do Outro. Concluímos, assim, que junto ao imaginário situa-se também o grande Outro, simbólico, cujo discur- so constitui o inconsciente.

    O grande Outro é considerado um lugar e representa a alteridade para o eu consciente. Dele são provenientes as determinações simbólicas relacionadas à história do sujeito e funciona como um arquivo das palavras dos outros considerados importantes pelo sujeito desde a sua infância. Este Outro determina os atos do sujeito, desde seu pensamento até sua ação e, por esta razão, o eu não pode ser senhor em sua própria casa.

    Na visão da Psicanálise, o processo da adolescência implica, jus- tamente, num incremento de desalienação, possibilitando a efetividade da operação de separação. O fato do Outro do inconsciente estar sempre presente na relação do sujeito com o outro, seu semelhante, o trabalho psíquico do sujeito adolescente torna-se ainda mais complexo, pois a operação de separação incidirá sobre aqueles que foram ou ainda são seus objetos de amor, ainda funcionando como suporte no enfrenta- mento do desamparo fundamental.

    É por meio dos semelhantes com quem convivemos – primeira- mente nossos pais, depois nossos mestres – que o desejo encontra as vias possíveis para sua circulação, travestindo-se de diferentes deman- das dirigidas ao sujeito.

  • O enlaçamento do sujeito com o Outro é traduzido de vários modos nas diversas relações humanas: familiares, amorosas e profissionais. A história do sujeito é uma história com a alteridade, sempre complexa, provocando efeitos de sofrimento, amor, inveja, ciúme e competição.

    A alteridade é fundamental, responde pela constituição do sujei- to, sendo o ponto de origem do desejo. São as palavras provenientes do campo da linguagem que constituem a matéria-prima para a formação do inconsciente, portanto, vem do Outro a determinação do destino do sujeito.

    Lembramos que, em psicanálise, sempre que falamos de sujeito, trata-se do sujeito do desejo e a adolescência é um momento de importância fundamental na cons- tituição da subjetividade.

    Freud não faz diferença entre adolescência e puberdade. Engloba neste último termo, as transformações corporais e psíquicas deste perí- odo da vida. Em seu texto Três Ensaios sobre a Sexualidade (1905) aponta como o trabalho psíquico mais importante, e doloroso, desta época da puberdade o desligamento da autoridade dos pais, o qual é imprescin- dível para a evolução cultural, dando, ao mesmo tempo, um certo cará- ter de crise na adolescência.

    Se considerarmos o adolescente como o sujeito que se confronta, simultaneamente, com o real do sexo e a responsabilidade do ato, podemos analisar a questão da alteridade na adolescência a partir desta conjunção.

    Assumir a responsabilidade de seus atos só se torna possível quando o sujeito adolescente efetua, suficientemente, o desligamento da autoridade dos pais.

  • Em termos psicanalíticos, a adolescência é entendida como um trabalho psíquico de elaboração de perdas, elaboração da falta no Outro e elaboração de escolhas. Estas concepções estão todas fundamentadas na afirmativa freudiana que aponta o desligamento da autoridade dos pais como o principal, e mais doloroso, trabalho psíquico a ser realiza- do na adolescência.

    A adolescência pode ser concebida como paralela à constituição de uma ética, quando o enfrentamento do desamparo passa a ser acom- panhado da responsabilidade pelos seus próprios atos. Este momento especial da constituição do sujeito – a adolescência – implica em demitir o Outro de sua função salvadora.

    Não se restringir a satisfazer às demandas e assumir-se como sujeito do desejo, corresponde ao atravessamento da adolescência. Sabemos que o desejo da mãe barrado permite o investimento do sujeito para além de seu meio familiar.

  • Gabarito? os não assinantes agradecem... as estatísticas não ajudaram dessa vez

  • Gabarito letra A

    Alguém pra interpretar sem só copiar e colar????????????

  • Possivelmente, o erro na alternativa III está em classificar a mudança de atitude frente a determinado grupo como "identidade ocasional". Talvez o conceito mais adequado seria "identidade circunstancial". 

     

     

    Percebe-se que Knobel (1992), subdividiu as diferentes identidades vividas pelos adolescentes, em três grupos. Que estão organizadas da seguinte maneira: identidade transitória; identidade ocasional e identidades circunstanciais.

     

    • Identidade transitória – São modelos de condutas próprias dos adolescentes que vivem de acordo com a estrutura do grupo. Não é uma definição concreta que eles têm sobre um determinado assunto. Suas atitudes variam constantemente, vivem esse período de transição sem preocupações, sem compromissos, levando tudo na esportiva, na brincadeira.

     

    • Identidade ocasional – É quando o adolescente adota uma postura em um determinado momento, numa ocasião especial ou simplesmente pelo fato de gostar, de fazer coisas diferentes, isto é, algo imediato, sem constrangimento, vivem em uma postura não delimitada. É o momento que faz o adolescente adotar tal postura. A felicidade de ter passado no vestibular, de ter conquistado aquela menina de seus sonhos, são situações que o adolescente adota em cada ocasião.

     

    • Identidades circunstanciais – O adolescente vive momentos circunstanciais em sua vida, tendo uma postura que varia de acordo com o momento. Por exemplo: na família, ele é rebelde, na escola ele pode ser agressivo, na igreja ser piedoso, no grupo de amigos ser submisso e assim por diante. Essas alternâncias no adolescente são consideradas normais, já para o adulto não são aceitáveis. Knobel (1981) considera normal essa atitude que ele chama de “síndrome da adolescência normal”.

    Disponível em: http://www.bdae.org.br/dspace/bitstream/123456789/719/1/tese.pdf

     

     

    Bons estudos!

     

     

  • Alguém sabe explicar o erro da alternativa IV ? Obrigada 

  • A alternativa IV está errada por se tratar das operações concretas e não formais. Um detalhe, mas importante para a situação avaliada.

    Espero ter ajudado.

  • O erro da IV acredito que seria pq ao atingir a fase de operações formais o indivíduo adquire a sua forma final de equilíbrio, ou seja, ele consegue alcançar o padrão intelectual que persistirá durante a idade adulta. Isso não quer dizer que ocorra uma estagnação das funções cognitivas, mas dizer como na questão de que "não ter adquirido todos os instrumentos lógicos necessários" é uma pegadinha.

  • IV - Errado

    Ao mencionar que na fase de Operações Formais o adolescente não possui todos os instrumentos lógicos necessários para a vida adulta, precisa-se descrever quais são esses instrumentos.

    Genericamente são: Estruturas: Arcabou psiquico (cognitivo); e Adaptação (ajustamento de antigas estruturas à novas funções). Ao mesmo tempo, esses dois conceitos constituem princípios da biologia que Piaget trouxe para a Psicogenética.

    Portanto, como as questões de provas exigem objetividade nas respostas, entende-se que: a ESTRUTURA pode estar a disposição de Cícero, porém ainda não deve haver o ajustamento dessas estruturas para o contexto citado no enunciado.

  • Embora Cícero sob o ponto de vista formal já esteja na faixa etária do Operatório - Formal ele não adquiriu os esquemas necessários para uma adaptação à vida adulta. Que se dá pelos processos "assimilação-adaptação" em decorrência dos diversos fatores psicossociais que interferiram em seu desenvolvimento.

  • Embora Cícero sob o ponto de vista formal já esteja na faixa etária do Operatório - Formal ele não adquiriu os esquemas necessários para uma adaptação à vida adulta. Que se dá pelos processos "assimilação-adaptação" em decorrência dos diversos fatores psicossociais que interferiram em seu desenvolvimento.

  • Sensório Motor: 0-2

    Pré-operatório: 2-7

    Operatório concreto: 7-11

    Operatório Formal: 11-15

  • De acordo com a tese Piagetiana, o estágio das Operações Formais, que acontece por volta dos 12 anos em diante, o indivíduo adquire a sua forma final de equilíbrio, alcança o padrão intelectual que persistirá durante a idade adulta. Não quer isso dizer que há uma estagnaçao das funções cognitivas. Seu desenvolvimento posterior consistirá numa ampliação de conhecimentos tanto em extensão como em profundidade, mas não na aquisição de novos modos de funcionamento mental.

  • IV De acordo com as contribuições piagetianas, Cícero encontra-se no período das operações formais, apesar de não ter adquirido todos os instrumentos lógicos necessários para enfrentar a vida adulta.

    Cícero está na fase operatório-formal, portanto, pela linearidade da teoria piagetiana, esses instrumentos lógicos já deveriam ter sido adquiridos.

  • A questão solicita conhecimentos acerca do atendimento psicológico baseado nas teorias psicanalíticas, os estágios de desenvolvimento de Piaget e o período da adolescência.


    O caso resume a Cícero, de 15 anos, criado apenas pela mãe e que apresenta problemas de comportamentos com sua mãe, a qual registra que seu filho é agressivo e desobediente. Seu histórico consiste em problemas escolares referentes a agitação e dificuldade de aprendizagem resultando em um diagnóstico de TDAH pelo qual foi medicamento por cinco anos. Tendo em vista esse panorama, precisamos compreender os vieses psicanalíticos, piagetianos e o período do desenvolvimento da adolescência de forma geral, para responder as afirmativas:


    I - CERTO


    Precisamos compreender que o período da adolescência é perpassado por importantes mudanças psíquicas, sociais e biológicas do indivíduo, o que pode ocasionar comportamentos    na tentativa de adaptar-se ao meio. Nesse período de transição da infância para vida adulta, o indivíduo deverá estabelecer decisões primordiais para sua vida futura: relacionamentos amorosos, identidade grupal (com objetivo de pertencimento a um grupo social que se identifique), vida profissional, entre outros. Além disso, há grandes transformações hormonais/biológicas que podem afetar a psique do sujeito e seu histórico relacional, médico e psicológico que está intrinsecamente relacionado com comportamentos atuais do sujeito. Portanto, é necessário que compreenda o contexto de inserção de Cícero para que possa efetivar uma intervenção mais adequada e condizente com sua realidade, destacando seu histórico médico, círculo social, familiar e mudanças biológicas.


    II - CERTO


    O esquema corporal, na visão psicanalítica, refere-se a uma intersecção entre o corpo em si (a matéria) e a imagem corporal (inconsciente) que o indivíduo possui dele. O corpo psicanalítico está relacionado ao campo simbólico e do imaginário, construído através das representações mentais, pulsão e investimentos libidinais. 


    “O esquema corporal designa o domínio do sujeito sobre seus movimentos e músculos, sobre as ações motoras. No esquema corporal, a ritmicidade dos movimentos vai se desdobrar de movimento em praxias, agitação em ação e de turbação em ato. O aleatório do movimento corporal passa a ser intencionado, ou seja, há um sujeito que deseja nas ações, e seus movimentos se direcionam aos objetos desejados" (PAIM & KRUEL, p. 164)


    Na adolescência, o esquema corporal se modifica devido às constantes transformações físicas e psíquicas do sujeito, que o fazem redirecionar seus impulsos libidinais a outros objetos. Nessa fase, as pulsões voltam-se para as atividades sexuais e sociais típicas da idade de Cícero. 



    III - ERRADO

    Na adolescência é comum o indivíduo ir em busca de identificações grupais, desejo de pertencer a um círculo. Nesse sentido, pode adquirir diferentes identidades na tentativa de se recolocar em um grupo. Existem diferentes tipos de identidade:


    Identidades transitórias: são aquelas que podem ser utilizadas por um certo tempo. 

    Identidades ocasionais: são aquelas que se formam quando surgem novas situações. 

    Identidades circunstanciais: são identificações parciais transitórias que surpreendem os pais do adolescente por assumir diferentes condutas quando estão em um grupo no colégio, no clube, etc. O adolescente age de forma diversa do seu comportamento dentro de casa.


    Nesse caso, o correto seria identidade circunstancial.



    IV - ERRADO



    O período das operações formais é o último estágio da teoria piagetiana do  desenvolvimento cognitivo. Inicia-se a partir dos 12 anos de idade e o adolescente possui capacidade para considerar os aspectos objetivos e concretos e os aspectos a nível simbólico, abstrato. O indivíduo adquire capacidade de previsão (e não só constatação), consegue relacionar conceitos abstratos e solucionar problemas de forma sistemática.  Cícero pode estar nessa fase devido a sua idade, mas o erro da questão está na afirmação que o adolescente não possui os instrumentos lógicos necessários. Não sabemos dessa informação pelo texto apresentado.

    Gabarito da Professora: Letra A.


    Fontes:

    ¹Paim, Fernando Free e Kruel, Cristina Saling. Interlocução entre Psicanálise e Fisioterapia: conceito de corpo, imagem corporal e esquema corporal. Psicologia: Ciência e Profissão [online]. 2012, v. 32, n. 1, pp. 158-173. Epub 18 Jun 2012. ISSN 1982-3703. 


    ² Aberastury A, Knobel M. Adolescência normal: um enfoque psicanalítico. Editora Artmed, São Paulo, 2003 (Texto modificado a partir do original) - (online)


  • A II é bem controversa.