SóProvas


ID
2911774
Banca
IF-PA
Órgão
IF-PA
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

     "O certo a ser feito": as marcas do utilitarismo no nosso dia-a-dia

                               Por Carlos Henrique Cardoso


      Ultimamente tenho analisado e refletido sobre a situação política do país e sua judicialização. E enxergo muito dos princípios do utilitarismo instaurados nos desejos de boa parte dos cidadãos. Enxergo o que? Como assim?

      O utilitarismo é uma teoria social desenvolvida pelo jurista, economista, e filósofo Jeremy Bentham, lá pelos fins do século XVIII e início do XIX. Essa teoria também foi objeto de estudo do filósofo John Stuart Mill. Tem como princípio a busca do prazer e da felicidade, mas também satisfazer os indivíduos na coletividade, almejando benefícios, onde as leis seriam socialmente úteis e as escolhas mais corretas. Alguns testes e dinâmicas de grupo também utilizam conceitos de base utilitarista, pautadas nas melhores escolhas para cada situação posta com a finalidade de encontrarmos um bem comum a todos.

      Um exemplo. No único hospital de uma pequena cidade, há apenas uma máquina de hemodiálise e quatro doentes renais. As características sociais, econômicas, profissionais, familiares, e pessoais de cada um são apresentadas e faz-se a pergunta: qual deles merece ser salvo para que possa utilizar o equipamento? Após um pequeno debate, chega-se à conclusão e as razões para que aquele felizardo seja o escolhido. Ou seja, o intuito é tomar decisões para obter o melhor resultado para todos.

      O utilitarismo pode ser transposto para o nosso cotidiano e sua doutrina ética pode estar incrustada em vários fatos e decisões. Sua aplicação pode ser considerável diante de fatores que venham a ocorrer e se tornar aceitável para diversos setores sociais.

      Digamos que comecem a aparecer pessoas feridas por rajadas de metralhadora nas ruas de um município e que muitos testemunharam um homem portando essa arma por aí. As autoridades partem a sua busca, mas não o encontram em lugar nenhum. E novas pessoas são baleadas. Com o rumo das investigações, familiares do suspeito são localizados. Como não informam seu paradeiro, os policiais passam a torturar seus pais, irmãos, e outros parentes a fim de obterem respostas ou pistas para sua descoberta. Dias depois, o “louco da metralhadora” é encontrado. A tortura é proibida por lei, mas sua utilização foi justificada pelo bem-estar público, ou seja, “o certo a ser feito”. Um cálculo que foi interpretado como moralmente aceitável por muitos que consideram aquela postura adequada para que mais ninguém fosse alvejado. Mesmo que jamais fosse preciso tomar tal atitude para um crime ser desvendado. Um princípio utilitarista.

      E assim observo muitas atitudes manifestadas por seguimentos de nossa população. Na véspera da decisão do Supremo Tribunal Federal em conceder ou não o Habeas Corpus para o ex-presidente Lula, grupos pediam que o STF não concedesse o HC porque Lula “tinha que ser preso”, pois já havia sido condenado. Apesar do HC ser um quesito legal, o desejo de prisão parecia ser maior que a virtude da lei. O que imperava era a vontade popular, o desejo de ver alguém que aprenderam a detestar, encarcerado. Importava menos o previsto em lei e mais “a voz das ruas”.

      Declarações de ministros e ex-ministros do STF engrossaram os manifestos. “Temos que ouvir a voz das ruas”, “o sentimento social”, e “o clamor popular” foram termos utilizados pelos ocupantes da Suprema Corte. Apesar das decisões judiciais não serem pautadas, obviamente, pelas vontades do povo profissionais que interpretam as leis não podem estimular aproximações demasiadas entre “as ruas” e os juízes, como termômetro a medir algum “choque térmico” entre a conclusão dos processos e os anseios sociais amparados pelas paixões e ódios. Uma linha tênue entre a lei e “o certo a ser feito”. Reflexões realizadas no calor dos acontecimentos podem influenciar atos finais moralmente justificáveis. Um receio calcado em posturas utilitaristas.

      Essas condutas são visíveis quando qualificam defensores dos Direitos Humanos – que seguem resoluções ratificadas por órgãos internacionais – como “defensores de bandidos”. Isso porque “o pessoal” dos Direitos Humanos defendem medidas previstas em leis e na Constituição Federal. Curioso que muitos dos críticos se referem aos Direitos Humanos como se fosse uma ONG, uma entidade representativa, com CNPJ, sede, funcionários (“o pessoal”) que se reúnem frequentemente em torno de uma grande mesa e passam a discutir políticas de apoio a assassinos, estupradores, e ladrões – uma espécie de “Greenpeace” voltado para meliantes. Com isso, proporcionam reflexões equivocadas sobre como devem ser tratados detentos, como a justiça deve agir com acusados de crime hediondo, ou como nossos policiais devem ser protegidos em autos de resistência ou intervenções repressoras. Tudo para alcançar o bem-estar social e “o certo a ser feito”. E a lei? Que se lasque!! Atos para que o “cidadão de bem” fique protegido das mazelas sociais e que se cumpra a vontade popular acima de qualquer artigo, parágrafo, inciso, ou decreto. Enquanto não se reestrutura o nosso defasado Código Penal, podemos bradar juntos as delicias de um Estado Utilitarista.

https://www.soteroprosa.com/inicio/author/Carlos-Henrique-Cardoso. Acessado em 28/01/2019 (Com adaptação)

Assinale a alternativa CORRETA quanto aos recursos linguísticos empregados no texto.

Alternativas
Comentários
  • GABARITO: LETRA B

    No período, “Apesar do HC ser um quesito legal, o desejo de prisão parecia ser maior que a virtude da lei.”. (6º parágrafo), a primeira oração estabelece uma relação de concessão em relação à segunda. --- Correto: "apesar de" é uma locução conjuntiva subordinativa concessiva.

    Força, guerreiros(as)!!

  • Locução conjuntiva subordinativa concessiva: exprime contrariedade, ressalva, oposição a uma ideia sem invalidá-la.

    embora;

    malgrado;

    conquanto;

    se bem que;

    posto que;

    nem que;

    ainda que/quando;

    apesar de que;

    mesmo que;

    dado que;

    ....

  • Que belo texto:

    a) na primeira oração, o sujeito não está preposicionado;

    d) o termo a fim está correto; indica que há uma finalidade;

    e) não há um afastamento, mas uma aproximação entre o autor do texto (emissor) e os leitores (receptor); ele se inclui ao fazer a alternância entre verbos.

  • Concessão

    A ideia de concessão está diretamente ligada à ideia de contraste, de quebra de expectativa. De fato, quando se faz uma concessão, não se faz o que é esperado, o que é normal. As orações adverbiais que exprimem concessão são chamadas concessivas. A conjunção mais empregada para expressar essa relação é "embora"; além dela, podem ser usadas a conjunção "conquanto" e as locuções "ainda que, ainda quando, mesmo que, se bem que, apesar de que".

    Exemplos:

    Embora fizesse calor; levei agasalho.

    Conquanto a economia tenha crescido, pelo menos metade da população

    continua à margem do mercado de consumo.

    Foi aprovado sem estudar ( = sem que estudasse / embora não estudasse). (reduzida de infinitivo)

    FONTE: https://www.mundovestibular.com.br/articles/538/3/O-QUE-SAO-ORACOES-SUBORDINADAS/Paacutegina3.html

  • GABARITO: LETRA B.

    Apesar de - Estabelece uma relação de concessão entre a segunda oração e a primeira oração.

  • Na alternativa A, o correto seria apesar de o HC... Assim o sujeito não estaria preposicionado, o que tornaria a oração correta?

  • NÃO EXISTE SUJEITO PREPOSICIONADO!

  • Existe sim sujeito preposicionado. Não existe NÚCLEO do sujeito preposicionado. A maioria dos sujeito na verdade possuem preposições.

  • Apesar de a Letra B ser a mais correta, gramáticos como Bechara aceitam a contração de Sujeito do Infinitivo com preposição.

    Prova 1 Fiscal de Rendas 2010 RJ

    7- Preservam-se a coerência textual e a correção 

    gramatical ao substituir

    a) “exerça” (ℓ.5) por exercesse.

    b) “desta”(ℓ.3) por de esta. Gabarito

    c) “se pode” (ℓ.11) por pode-se.

    d) “ser ressaltado”(ℓ.14) por ser ressaltada.

    e) “em instrumento”(ℓ.15) por de instrumento.

    Fiquei sabendo recentemente, nunca vi isso no Cespe. Mas conhecimento nunca é demais. Bons estudos!

  • Apesar, pode ser substituído por EMBORA. Conjunção CONCESSIVA

  • Em Língua Portuguesa, sujeito ALGUM pode começar em preposição.

    Por essa razão, é erro usarmos formas contraídas ou combinadas junto a palavras que sejam sujeito de uma oração.

    Ex. Chegou a hora de ESSE político dizer a verdade. (nunca: desse político)

    Era difícil de ELE perceber o erro. (nunca: dele)

    Está na hora de A onça beber água. (nunca: da onça)

  • Na sequência preposição + sujeito + verbo no infinitivo, constitui grave erro gramatical combinar a preposição com o sujeito da oração reduzida de infinitivo.

    “[...] relacionadas ao fato do patrimônio do ministro ter aumentado pelo menos 20 vezes de 2006 para 2010.” (incorreto)

    “[...] relacionadas ao fato de o patrimônio do ministro ter aumentado pelo menos 20 vezes de 2006 para 2010.”(Folha de São Paulo) (correto)

    “Antes deles chegarem ao palácio, as homenagens não poderão ser iniciadas.” (incorreto)

    “Antes de eles chegarem ao palácio, as homenagens não poderão ser iniciadas.” (correto)

    “Há possibilidade desta autora desistir da ação.” (incorreto)

    “Há possibilidade de esta autora desistir da ação.” (correto)

  • Vejamos: 

    a) No período, “Apesar do HC ser um quesito legal, o desejo de prisão parecia ser maior que a virtude da lei.”. (6º parágrafo), o sujeito da primeira oração está preposicionado, de acordo com a norma culta da língua portuguesa. ERRADA - Não exite sujeito preposicionado. 

     

     b) No período, “Apesar do HC ser um quesito legal, o desejo de prisão parecia ser maior que a virtude da lei.”. (6º parágrafo), a primeira oração estabelece uma relação de concessão em relação à segunda. CORRETA.

     

     c) Em “Apesar do HC ser um quesito legal, o desejo de prisão parecia ser maior que a virtude da lei.” (6º parágrafo), o elemento coesivo que inicia o período, pode ser substituído pela conjunção “consoante”, sem prejuízo quanto ao sentido e à correção gramatical. ERRADA - "Apesar de" é uma conjunção subordinativa concessiva.  "Consoante" é uma conjunção subordinativa conformativa, e nesse caso mudaria o sentido.

     

     d) No excerto “Como não informam seu paradeiro, os policiais passam a torturar seus pais, irmãos, e outros parentes a fim de obterem respostas ou pistas para sua descoberta.”(5º parágrafo), o termo em negrito está incorretamente grafado, a forma culta é “ afim”. ERRADA - "A FIM" tem sentido de objetivo, finalidade e se for trocado por "afim" passa a ter sentido de afinidade o que não seria o caso. 

     

     e) A alternância de verbos na terceira pessoa do singular e primeira do plural denota um afastamento entre emissor e receptor. ERRADA - plural lembra de quantidade.

     

    AVANTE!

  • GAB B CONCESSIVAS: Embora, Ainda que, APESAR DE QUE, Se bem que , Mesmo que, Por mais que, Posto que, Conquanto, A despeito, Malgrado, Em que pese, etc. NOTA: As concessivas indicam uma espécie de obstáculo ao fato expresso na outra oração, sem contudo impedí-lo. NÃO CONFUNDIR C/ AS ADVERSATIVAS Mas, Contudo, Entretanto, Todavia, etc.