SóProvas


ID
3411637
Banca
IBADE
Órgão
SAAE de Vilhena - RO
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

CIDADE DE MESENTÉRICOS [OLAVO BILAC, 1899]


      Há casas vastas e belas que ficam longo tempo fechadas, num silêncio de morte, num sono de aniquilamento.

        Conhecem os senhores cousa mais triste do que um palácio desabitado? Enquanto os outros prédios, em torno, abrem o seio, durante o dia, ao sol, e à noite, despejam para fora, pelas janelas rasgadas, o pairar da alegria, da música e das conversas — a casa vazia fica fechada e triste como um túmulo.

      O Rio de Janeiro está, quase sempre, assim... Cidade macambúzia, cidade de dispépticos e de mesentéricos, Sebastianópolis parece estar sempre carregando o luto de uma grande catástrofe. Já alguém notou que o carioca anda sempre olhando para o chão, como quem procura o lugar em que há de cavar a própria sepultura. E quem escreve estas linhas já viu, uma noite, a polícia prender três rapazes que, havendo ceado bem, se recolhiam à casa de amigos cantando um coro de uma opereta qualquer. E prendê-los por quê? Porque cantavam... Triste cidade!

       Santo Deus! que sejam tristes, soturnas e embezerradas as cidades do extremo Norte da Europa, que uma névoa perpétua amortalha — cousa é que se compreende. A tristeza do céu entristece as almas... Mas que seja melancólica uma cidade como esta, metida no eterno banho da luz do sol — luz que se desfaz em beijos e sorrisos pelas copas das árvores, pelas fachadas das casas, pelos buracos das ruas —, isso é cousa que não se entende!

       Felizmente, agora, o Rio de Janeiro parece sair do seu letargo.

       Voltemos à imagem da casa desabitada. Que alegria, quando, depois de longo luto, abrem-se as janelas do prédio à luz e ao ar, e espanam-se os móveis, e sacodem-se as cortinas, e o piano acorda cantando uma valsa leve, e as crianças se espalham pelos corredores, correndo e chalrando!

      Assim, o Rio de Janeiro, atualmente, nestes dias de festa. Antes da chegada do presidente Rocca,1 a chegada do governador Viana...

       Passeatas, banquetes, espetáculos de gala, corridas — as costureiras trabalhando sem descanso, todo o comércio rejubilando —, uma delícia para todo mundo!

        Ah! quem dera que fosse sempre assim, Sebastianópolis!

      E por que não és tu sempre assim, uma feira franca do riso e do pagode? Talvez porque o nosso temperamento seja realmente mais sujeito à melancolia do que à jovialidade? Não! há quem diga que a nossa tristeza depende exclusivamente da nossa imundície.

       Diz-se que, certa vez, um homem, pouco dado ao uso do banho, sentiu-se atolar no pântano de uma melancolia sem tréguas. Foi consultar um médico, que lhe aconselhou o uso de banhos diários. E logo ao segundo banho o sujeito ficou tão curado, que morreu... de um frouxo de riso.

       O remédio é fácil de experimentar. Mal não fará, com certeza: e é mais que provável que faça bem, e grande bem...

        Ah! quem poderá viver bastante para te ver saneada, ó cidade do Rio de Janeiro? 

      A gente, desde que se entende, ouve dizer que o Brasil só não está hoje inteiramente povoado por causa do flagelo periódico da febre amarela. Sabem isto os governos, sabe isto o povo. Todos os médicos que há sessenta anos saem das nossas faculdades, dizem e escrevem que a causa da febre amarela é a falta de saneamento das cidades. Ninguém ignora que o vômito-negro, por anos e anos, devastou as populações de Galveston, de Filadélfia, de Memphis, de New Orleans, e que dessas cidades desapareceu para sempre — assim que, saneadas e acostumadas à limpeza, elas deixaram de oferecer ao desenvolvimento da epidemia um meio favorável. Torres Homem, Ferreira de Abreu, todos os grandes clínicos do Brasil se têm esbofado em pedir o saneamento — declarando terminantemente que ele é o único meio de combater e aniquilar a pirexia assassina.

      Mas nada se tem feito. Os dias passam, e a gente continua a esperar que as redes aperfeiçoadas de esgotos, as drenagens do solo e os abastecimentos d'água caiam do céu por descuido — como se o céu tivesse algum interesse nisso.

        Agora, parece que o sr. prefeito municipal resolveu meter uma lança em África, pedindo ao conselho que o autorize a abrir largamente os cofres do município em favor da ideia.

       Claro está que isso só pode merecer aplauso. Mas... — forte desgraça é esta! Sempre há de aparecer este mas cruel, esta abominável adversativa que atrapalha tudo! Mas... que ideia é esta de pedir a uma corporação médica que estude mais uma vez o saneamento?

      Ninguém se cansaria ainda em reeditar a bolorenta série dos injustos epigramas com que tem sido crivada a classe dos médicos — desde a prosa de Molière até as desaforadas redondilhas de Bocage. Já se sabe que há no Brasil médicos que são glórias legítimas e incontestáveis desta terra. Mas sabe-se também que entre os médicos brasileiros, e principalmente entre os médicos do Rio de Janeiro, há uma rivalidade feroz, uma luta sem tréguas, uma guerra de morte. 

      Passam-se meses sem que venham a público manifestações desse desacordo profundo: de repente, porém, um alarido cresce nos ares, e, pelas colunas pagas ou não pagas dos jornais, começa a ferver o escândalo, e começam a chocar-se as injúrias, e é um nunca mais acabar de acusações, de doestos, de denúncias, de revelações escabrosas.

       Agora mesmo estamos assistindo a uma dessas batalhas edificantes. A galeria baba-se de gosto, e as empresas dos jornais apanham o melhor do combate, que é o dinheiro dos combatentes. Se à cabeceira de um doente, por causa de uma talha malfeita, ou de um tifo mal combatido, há tão ásperas lutas, que não haverá à cabeceira da cidade, por causa do saneamento?

       Enfim, o que devemos todos fazer é pedir a Deus que ilumine o Concílio, mantendo sobre ele a sua infinita Graça — e pedir aos médicos que economizem palavras, porque não há de ser com elas que a municipalidade saneará o Rio de Janeiro. 

                                                                         (Gazeta de Notícias, 30/7/1899)


Talvez porque o nosso temperamento seja realmente mais sujeito à melancolia do que à jovialidade?” A análise dos termos está correta em:

Alternativas
Comentários
  • GABARITO: LETRA D

    ? Talvez porque o nosso temperamento seja realmente mais sujeito à melancolia do que à jovialidade?

    ? Adjetivo "sujeito" pedindo um complemento preposicionado, um complemento nominal (=sujeito a alguma coisa, preposição "a" + artigo definido "a" que acompanha o substantivo "melancolia"= crase; o termo "à melancolia" completa o sentido de um nome, ele é um complemento nominal).

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    ? FORÇA, GUERREIROS(AS)!! 

  • qual é o núcleo do predicado?

  • Os possíveis núcleos do predicado verbal são verbo transitivo direto, verbo transitivo indireto, verbo transitivo direto e indireto ou verbo intransitivo.

    Verbo de ligação não é núcleo de predicado verbal.

    O verbo da oração é "seja" e é verbo de ligação.

  • Emiliane Faria, o verbo de ligação (ser) nos aponta a existência de um predicado nominal, que compreende o verbo e tudo que se lhe segue: "(...) seja realmente mais sujeito à melancolia do que à jovialidade?". Toda a estrutura entre aspas ilustra o predicado nominal. Em contrapartida, o núcleo do predicado nominal repele o verbo e será sempre um adjetivo ou um substantivo. No caso em tela, o adjetivo "sujeito" é o núcleo, o elemento central.

  • queri tanto saber responder uma questao dessa.

  • talvez – é um adjunto adverbial de dúvida

    à jovialidade – complemento nominal

    seja – verbo de ligação

    à melancolia – complemento nominal. CORRETO

    temperamento – substantivo (núcleo dos termos)

  • Eu não entendi porque estamos diante de um complemento nominal. Alguem pode me explicar?

  • Maycon, eu acho que é pq o Adjunto Abdominal é um termo que vai caracterizar, determinar, modificar, especificar ou restringir apenas um substantivo, já o complemento nominal é sempre precedido de preposição e completa o sentido de substantivos, adjetivos e advérbios que apresentam transitividade.

    No caso da questão temos o adjetivo "sujeito" que é transitivo e pede a preposição "a", logo tanto jovialidade e melancolia são complementos nominais.

    Não tenho ctz, caso esteja errado me corrigem pfv

  • Maycon,

    Complemento nominal (completa o nome). Neste caso, completa o sentido de "sujeito". Estar sujeito à (...)-- precisa-se de uma preposição para complementar: à melancolia.

  • "à melancolia" substantivo abstrato de forma passiva, ou seja recebe a ação. complemento nominal

    fonte: Elias Santana

  • Talvez porque o nosso temperamento seja realmente mais sujeito à melancolia - sofre a ação

    complemento nominal

  • Vocês não tem noção do quanto me ajudam com esses ótimos comentários! Gratidão!!

  • Assertiva D

    à melancolia – complemento nominal.

  • Complemento Nominal: relação com adjetivo, advérbio e substantivo abstrato (paciente).

    Ex: A construção do prédio terminou.

    Construção: substantivo abstrato

    Do prédio: complemento nominal (paciente: o prédio sobre a ação de construir)

    Adjunto Adnominal: relação com substantivo concreto e substantivo abstrato (agente).

    Ex: A construção do engenheiro terminou.

    Construção: substantivo abstrato

    Do engenheiro: adjunto adnominal (agente: o engenheiro pratica a ação de construir)

    -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    A palavra SUJEITO é um adjetivo (troque por outro para identificar melhor, eu troquei por propício).

    Logo, "à melancolia" está relacionada com um adjetivo, então é um complemento nominal.

    (Lembrando: a única ligação que pode complicar seria em relação ao substantivo abstrato, que existe tanto no complemento quanto no adjunto, então quando ocorrer deve-se verificar se é paciente ou agente. Nos demais casos, não há porque ter dúvida.)

    CORRETA: D

  • Sujeito à melancolia.....

    melancolia está como agente passivo?  jurava que esta´como ativo. Algém está suleito a ela.

    ??

  • falando em sentimentos

    quando gera, causa e provoca, é CN

    quando posse, é A.ADN

  • Quem está respondendo questões na quarentena dá um like aqui.

    #laveasmãos

    #FIK_IN_HOUSE.

  • GABARITO D

    Talvez porque o nosso temperamento seja realmente mais sujeito à melancolia.

    Sujeitar-se a algo... à melancolia. A palavra é seguida de preposição e "sujeito" é uma ação abstrata.

    Complemento nominal.

  • GABARITO D

    Talvez porque o nosso temperamento seja realmente mais sujeito à melancolia.

    Sujeitar-se a algo... à melancolia. A palavra é seguida de preposição e "sujeito" é uma ação abstrata.

    Complemento nominal.

  • Temperamento sujeito à melancolia. ou seja se sujeitava a ela que era o alvo! sujeito paciente.portanto complemento !

  • mais sujeito à melancolia do que à jovialidade...

    Letra D

  • O núcleo do predicado nominal é o predicativo do sujeito.

    O núcleo do predicado verbal é o próprio verbo.

  • Gente "sujeito" no caso dessa questão não é adjetivo...de onde vocês estão tirando essa ideia? Estar sujeito a alguma coisa, verbo sujeitar-se, ser propício a alguma coisa...é tudo verbo povo!! Essa questão deveria ter sido anulada!