SóProvas


ID
4116388
Banca
IDECAN
Órgão
Prefeitura de Apiacá - ES
Ano
2016
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

A língua como ela é

    Nos últimos dias tive uma experiência muito gratificante cumprindo o meu papel de professora de língua portuguesa – sim, gosto de enfatizar que dou aula de língua e não de gramática da língua. Pois é, nos últimos dias ensinei a nossa língua portuguesa a estrangeiros ávidos por aprender o idioma oficial do país que sediou o maior evento esportivo do planeta. São pessoas de todas as partes com um objetivo em comum: interagir, comunicar-se em português.

    Como práxis, nas aulas iniciais, ensinamos o verbo “ser” e “estar”; para nós brasileiros, o famoso e enfadonho verbo to be das aulinhas de inglês. Então, a lição inicial é fazer com que os iniciantes entendam a diferença entre ambos os verbos, já que na língua do Tio Sam tal diferença só é percebida no contexto comunicativo. As explicações acontecem com exemplos reais, a fim de mostrar-lhes a língua como ela é.

    Nas aulas para estrangeiros o “tu” e o “vós” são abolidos, completamente descartados, e isso é o sonho linguístico de toda e qualquer criança brasileira. Imaginem o tormento: conjugação do verbo “ir”, no presente do indicativo “tu vais”, “vós ides” e a criança inconformada e chorosa pergunta: “Mãe, alguém fala isso? Eu não falo”. Pois é, sábia conclusão! A criança, com seu conhecimento linguístico inato, não reconhece o idioma descrito na Gramática e intui que aquelas conjugações trarão uma imensa dor de cabeça e possíveis notas vermelhas.

    A língua como ela é não se apresenta, com pretérito-mais-que-perfeito, como insiste a Gramática Normativa e seus exemplos surreais: “O vento fechou a porta que o vento abrira.” Abrira?

    Com o futuro também temos problemas. Não, não sou vidente, não me refiro ao amanhã, refiro-me ao tempo gramatical. Ele, como a GN sugere, não participa dos nossos planos, visto que um casal, ao sonhar com o ninho de amor, não enrola a língua para conjugar o verbo “querer” e, em vez de dizer “Nós quereremos um apartamento de frente para o mar”, usam a corriqueira forma composta “Vamos querer...”. A partir disso, façamos uma reflexão: por que não mostrar aos nossos pupilos os tempos verbais no contexto da nossa realidade linguística? O tempo futuro pode ser dito com a forma composta (verbo auxiliar no presente + verbo principal no infinito) acompanhada pelo advérbio de tempo que situa a ideia. Sendo assim, dizemos: “Vou viajar amanhã”. E falar assim é menos futuro? É tanto quanto em “Viajarei amanhã”, com o detalhe de que está caindo em desuso na fala do dia a dia.

    Ah! Como é gostoso ensinar a língua viva! Aquela que não está engessada nos compêndios gramaticais! Porém, os gramáticos que elaboram tais manuais afirmariam categoricamente: ensinar português para estrangeiros é diferente de ensinar português a uma criança nativa, afinal, ela já sabe português. Concordo! Claro que não precisamos ensinar as diferenças entre ser e estar, levar e trazer, conhecer e saber, confusões típicas de um aprendiz não nativo.

    Sugerir e advogar a favor do ensino real da língua significa retirar o que não é utilizado ou é raramente visto na escrita, é ignorar regras inúteis que não influenciam na compreensão da língua. Um exemplo clássico é o pronome oblíquo no começo da oração. Os puristas da língua consideram um erro crasso, mas que mal pode haver em dizer “Me empresta o seu livro do Veríssimo”? E por que não escrever assim também? É uma tendência nossa o uso da próclise, enquanto os portugueses preferem a ênclise. O nosso olhar para com os fenômenos linguísticos se compara ao estudo de um biólogo ou de um botânico, que não diz que aquela flor é mais ou menos bela por causa do formato das pétalas ou da coloração. Falar “empresta-me” não é mais ou menos bonito, é diferente, e em ambos os casos a comunicação acontece.

    Portanto, a minha singela conclusão é que precisamos de gramáticas que não tenham espaço para mesóclise, pronome possessivo “vosso”, lista de substantivos coletivos, tipos de sujeito e predicado, enfim, uma série de bobagens e gramatiquices que não ensinamos para os estrangeiros, porque não são relevantes para comunicação, também porque não fazem parte da língua como ela é.

(Disponível em http://conhecimentopratico.uol.com.br/linguaportuguesa/gramatica-ortografia/53/artigo344826-1.asp Acesso em: 08 set 2016.)

Assinale a alternativa que apresenta a adequada análise do fragmento destacado do texto.

Alternativas
Comentários
  • A norma culta prevê com conjugação correta do verbo "querer" no futuro do presente do indicativo como "quereremos" (1º pessoa do plural), é foneticamente estranho, mas está correto.

  • futuro do presente do indicativo

    eu quererei

    tu quererás

    ele quererá

    nós quereremos

    vós querereis

    eles quererão

  • A. Não se inicia frase com pronome oblíquo.

    B. O pronome em questão tem função catafórica, retoma um termo anteriormente citado.

    C. Correta

    D. O uso de crase será obrigatório.

  • A questão é sobre colocação pronominal, coesão textual, verbos e crase e quer que marquemos a alternativa que apresenta a adequada análise do fragmento destacado do texto. Vejamos: 

     .

    A) “Me empresta o seu livro do Veríssimo”? (7º§) ilustra um caso de ênclise e “Falar ‘empresta-me’” (7º§) constitui um exemplo de próclise.

    Errado. Em “Me empresta o seu livro do Veríssimo”? temos um caso de próclise (pronome "me" antes do verbo) e em "“Falar ‘empresta-me’” temos um caso de ênclise (pronome "me" depois do verbo).

     .

    B) “As explicações acontecem com exemplos reais, a fim de mostrar-lhes a língua como ela é.” (2º§) O pronome “lhes” tem função anafórica ao retomar o termo “brasileiros”.

    Errado. "Lhes" refere-se a "iniciantes": "... a fim de mostrar-lhes [aos iniciantes] a língua como ela é". No texto, temos: "Então, a lição inicial é fazer com que os iniciantes entendam a diferença entre ambos os verbos, já que na língua do Tio Sam tal diferença só é percebida no contexto comunicativo. As explicações acontecem com exemplos reais, a fim de mostrar-lhes a língua como ela é".

     .

    C) “Nós quereremos um apartamento de frente para o mar”, usam a corriqueira forma composta “Vamos querer...” (5º§). A forma verbal “quereremos” está flexionada no futuro do presente do indicativo.

    Certo. "Quereremos" é a 1ª pessoa do plural (nós) do futuro do presente do indicativo: Eu quererei. Tu quererás. Ele quererá. Nós quereremos. Vós querereis. Eles quererão.

     .

    D) “Não, não sou vidente, não me refiro ao amanhã, refiro-me ao tempo gramatical.” (5º§) Se o termo “tempo” for substituído por “pessoa”, o uso do acento indicativo de crase no “a” que antecederá “pessoa” será facultativo.

    Errado. Se o termo “tempo” for substituído por “pessoa”, o uso do acento indicativo de crase no “a” que antecederá “pessoa” será obrigatório e não facultativo: refiro-me À pessoa. Nesse caso, haverá a fusão da preposição "a" exigida pelo verbo "referir" (quem se refere, refere-se A algo) + o artigo feminino "a" de "A pessoa": A + A = À.

     .

    Gabarito: Letra C  

  • B)

    Errado. "Lhes" refere-se a "iniciantes": "... a fim de mostrar-lhes [aos iniciantes] a língua como ela é". No texto, temos: "Então, a lição inicial é fazer com que os iniciantes entendam a diferença entre ambos os verbos, já que na língua do Tio Sam tal diferença só é percebida no contexto comunicativo. As explicações acontecem com exemplos reais, a fim de mostrar-lhes a língua como ela é".

    Fonte: monitor do QC

  • Qcolegas, sobre o item b):

    -função catafórica se refere a termo que será desenvolvido.

    -função anafórica se refere a termo já desenvolvido.

    O erro está em afirmar que se refere a brasileiros, quando, a meu ver, seria "iniciantes".

    anáfora

    substantivo feminino

    1. 1.
    2. estilística•retórica
    3. repetição de uma palavra ou grupo de palavras no início de duas ou mais frases sucessivas, para enfatizar o termo repetido (p.ex.: este amor que tudo nos toma, este amor que tudo nos dá, este amor que Deus nos inspira, e que um dia nos há de salvar ).
    4. 2.
    5. por extensão•gramática
    6. processo pelo qual um termo gramatical retoma a referência de um sintagma anteriormente us. na mesma frase (p.ex.: Comeram, beberam, conversaram e a noite ficou nisso ) ou no mesmo discurso (p.ex.: Fui ao Museu de Artes Modernas. Lá, encontrei vários de meus amigos ).

  • Quer = radical

    e = vt

    re = des. modo-tempo

    mos = des. núm-pess.