SóProvas


ID
4891072
Banca
IDECAN
Órgão
CRN - 8ª Região (PR)
Ano
2015
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Você já rebateu um absurdo hoje?


Os tempos de crise são um terreno fértil para os discursos de ódio e apelos autoritários.

Confrontá‐los no dia a dia é uma forma de evitar que se tornem, um dia, projetos reais.


    Tenho a péssima mania de responder absurdos com silêncio. Quanto maior o absurdo, menor a vontade de falar. Percebi a gravidade dessa relação porque tenho andado muito quieto ultimamente. A vida em rede me acostumou mal: habituado a conversar com quem já tem uma predisposição em ouvir, aprendi a despejar na internet, não sem certa arrogância, tudo o que tinha vontade de dizer e não disse quando o taxista falou que a cidade só teria jeito quando pegassem o bairro pobre, jogassem gasolina e botassem fogo. Ou quando a socialite levantou a taça de espumante e, com um olho na piscina e outro na bolsa Louis Vuitton, se disse assustada com a calamidade em que vivemos no Brasil.

    Tudo começou, acho, na adolescência, quando a vizinha gente‐boa levou uma tarde a me desejar boa sorte na minha viagem a São Paulo, onde dali em diante eu passaria a morar e estudar. Atenciosamente, ela me deu um roteiro de passeios, dicas, culturas e cuidados na metrópole. Ao fim da conversa, soltou um “só tome cuidado porque é uma cidade infestada por imigrantes, e eles estão acabando com tudo”. Ainda hoje me questiono por que não a rebati, ali, na lata. Foi porque só tinha 19 anos? Por não querer ser indelicado? Para não azedar a boa vizinhança? Mas de que vale ter vizinhos assim, que só te respeitam porque te veem como um igual?

    Na conversa, ela me pedia para reparar como os imigrantes de vários sotaques se espalhavam em nossa cidade do interior trazendo sujeira e insegurança. “Em São Paulo é ainda pior”, reforçava. Lembrei que, naquela época, uma série de assaltos a repúblicas estudantis das redondezas era noticiada pelos jornais locais. Pouco depois, a quadrilha foi identificada, e qual não foi o choque quando descobrimos que um vizinho nosso, branco e de classe média, estava envolvido. Na mesma época, acordamos certa manhã de sonos intranquilos com a Polícia Federal à porta do prédio. Os agentes estavam em busca de um morador, querido por todos, que integrava um suposto esquema ilegal de fabricação e comércio de couro. A realidade desmentia a tese daquela senhora que se gabava de ter livros por todo canto de casa, embora não tivesse olhos para entender o mundo para além da própria janela. “A insegurança é sempre o outro”, concluía comigo mesmo, sem jamais dizer nada.

    À medida que me adaptava à vida em São Paulo, e aos círculos menos inóspitos da vida universitária, me acostumei a falar em guetos. Neles, enquanto tentávamos entender a lógica da discriminação em um país ainda marcadamente desigual, dividíamos nossas angústias como numa roda de reabilitados. Falávamos da tia racista que achava um absurdo o namoro do artista mulato com a atriz branca. “Preconceito contra eles mesmos”, repetia a parente, para a concordância bovina de todos à mesa.

    A sequência era conhecida. “Bons eram os tempos dos militares; tomávamos cascudos, mas andávamos na linha”. “O Brasil é um país de belezas naturais e um povo criado na malandragem.” “Político é tudo igual.” “Virou gay porque faltou chinelada.” “Virou lésbica porque não encontrou o cara certo.” “Ninguém mandou usar saia.” E etc, etc. Nos círculos sociais, lidamos o tempo todo com autodidatas especializados em política e sociedade.

    Toda vez que essas conversas reaparecem, é como se eu tivesse a chance de rebater aquela vizinha, já sem as amarras da imaturidade. Dias atrás ela reapareceu em uma conversa num Café decorado e com ar‐condicionado. Vestia terno e tinha certeza que o calor tropical inibia a vocação do brasileiro ao trabalho. Exatamente à sua frente, separado apenas por um vidro blindado, um pedreiro se derretia para erguer um muro de tijolo sob o sol a pino. Pensei em apresentar um para o outro, mas, como sempre, calei.

     “Deixem falar. São só ignorantes”, dizem os amigos, enquanto guardam os cartuchos para os grandes debates com professores, autoridades públicas, grandes corporações etc.

    A verdade é que nessas manifestações gratuitas de ingenuidade/ignorância não está o exercício saudável do debate. Está a fórmula autoritária de falar e ser ouvido e, se rebatido, correr para a linha segura do tatame com uma velha muleta: “É só a minha opinião, você precisa respeitar”. Confundimos, então, silêncio com respeito, e determinamos arbitrariamente quem merece e quem não merece ser contrariado. Aquela lição canhestra herdada da ditadura, a de que política não se discute, ainda faz estragos: dizer o que se pensa se transformou em uma espécie de pregação a convertidos. Por aqui, debate, conflito e contraponto não sensibilizam consensos, mas melindres. Por isso, e para evitá‐los, calamos.

    Tempos atrás, quando todos pareciam satisfeitos em seus quadrados, essas pontas de fagulha pareciam inofensivas. Agora os tempos mudaram. Em parte devido à conjuntura mundial, em parte devido a apostas equivocadas dos governos locais, em parte devido à insensibilidade para perceber que os modelos se esgotaram, o cobertor se encurtou, as saídas se estreitaram, a crise se avizinhou, o pirão acabou e a primeira reação nesses guetos é garantir primeiro a sua farinha.

(Disponível em: http://www.cartacapital.com.br/sociedade/voce‐ja‐rebateu‐um‐absurdo‐hoje‐3639.html Acesso em: 09.03.2015. Adaptado.)

Analise o fragmento destacado a seguir:


A verdade é que nessas manifestações gratuitas de ingenuidade/ignorância não está o exercício saudável do debate. Está a fórmula autoritária de falar e ser ouvido e, se rebatido, correr para a linha segura do tatame com uma velha muleta...” (8º§).


Só NÃO une os períodos anteriores, de forma coerente e coesa, o conectivo

Alternativas
Comentários
  • Portanto, visto que é uma conjunção com valor de conclusão e os demais possuem valor de oposição/adversidade.

    GABARITO. C

  • Se for pela lógica todos são conjunções adversativas, apenas a letra C é conclusiva.

    Gab.: C.

  • Alguém poderia explicar melhor? já que não tem comentário de professor

  • gab c

    Período é encontrado contando frases que terminam com ponto final.

    A = A verdade é que nessas manifestações gratuitas de ingenuidade/ignorância não está o exercício saudável do debate. todavia Está a fórmula autoritária de falar e ser ouvido e, se rebatido, correr para a linha segura do tatame com uma velha muleta...

    B = A verdade é que nessas manifestações gratuitas de ingenuidade/ignorância não está o exercício saudável do debate. contudo Está a fórmula autoritária de falar e ser ouvido e, se rebatido, correr para a linha segura do tatame com uma velha muleta...

    C = A verdade é que nessas manifestações gratuitas de ingenuidade/ignorância não está o exercício saudável do debate. portanto Está a fórmula autoritária de falar e ser ouvido e, se rebatido, correr para a linha segura do tatame com uma velha muleta... (portanto é uma conjunção conclusiva e os períodos dão ideias de oposição)

    D = A verdade é que nessas manifestações gratuitas de ingenuidade/ignorância não está o exercício saudável do debate. entretanto Está a fórmula autoritária de falar e ser ouvido e, se rebatido, correr para a linha segura do tatame com uma velha muleta...

    conjunções adversativas = mas, porém, no entanto, entretanto, contudo, todavia

    DEUS é justo e poderoso. amém!

  • Que brisa as questões dessa banca '-'

  • Se as questões de interpretação de texto dessa banca são assim, fico imaginando como vai ser a discurssiva.

  • Todavia, contudo, entretanto são conjunções adversativas, portanto é conclusiva, já que ele pede a única diferente a resposta é portanto.

  • entendi foi nada

  • não entendi muito bem a questão, porém... que texto!

  • ´Portanto´

    gab: C

    • Nessa questão utilizei o macete do TOME NO COPO, bizu para as conjunções adversativas

    TOdavia

    Mas

    Entretanto

    NO entanto

    COntudo

    POrém

  • Se souber as conjunções matou a questão :)

  • Trata-se de uma ORAÇÃO COORDENADA SINDÉTICA.

    Onde é necessário o conhecimento das conjunções.

    contudo, entretanto e todavia = ADVERSATIVAS

    porquanto = CONCLUSIVA.

    Portanto letra B.

  • Marquei a letra que não era conjunção adversativa

  • A questão quer saber qual conectivo não poderia unir os períodos em exposição. Vejamos:

     Devemos saber, primeiramente, que os períodos destacados estão sendo separados pelo sinal de pontuação como de costume. Sabendo disso, podemos seguir com a ideia de que as alternativas A, B e D apresentam conjunções de adversidade (todavia, contudo, entretanto) e, somente, a C apresenta uma diferente das demais, assim só podendo ser o nosso gabarito. Iremos fazer as substituições em cada assertiva.

    "A verdade é que nessas manifestações gratuitas de ingenuidade/ignorância não está o exercício saudável do debate. Está a fórmula autoritária de falar e ser ouvido e, se rebatido, correr para a linha segura do tatame com uma velha muleta...”

     a) Correta.

    "A verdade é que nessas manifestações gratuitas de ingenuidade/ignorância não está o exercício saudável do debate, todavia está a fórmula autoritária de falar e ser ouvido e, se rebatido, correr para a linha segura do tatame com uma velha muleta...”.

    b) Correta.

    ."A verdade é que nessas manifestações gratuitas de ingenuidade/ignorância não está o exercício saudável do debate, contudo está a fórmula autoritária de falar e ser ouvido e, se rebatido, correr para a linha segura do tatame com uma velha muleta...”.

    c) Incorreta.

    "A verdade é que nessas manifestações gratuitas de ingenuidade/ignorância não está o exercício saudável do debate, portanto, está a fórmula autoritária de falar e ser ouvido e, se rebatido, correr para a linha segura do tatame com uma velha muleta...”. Forçamos a barra aqui, mas não fica legal, porque o segundo período apresenta uma ideia de oposição à anterior. O primeiro período fala mal da manifestação e o segunda cita que essa é a maneira que o indivíduo tem de se expressar e ser ouvido, mesmo sendo ruim. A conjunção "portanto" é de conclusão e não de oposição, adversidade e contraste.

    d) Correta.

    "A verdade é que nessas manifestações gratuitas de ingenuidade/ignorância não está o exercício saudável do debate, entretanto está a fórmula autoritária de falar e ser ouvido e, se rebatido, correr para a linha segura do tatame com uma velha muleta...”.

    Gabarito do monitor: C

  • FALANDO DE MANEIRA OBJETIVA, O CANDIDATO TEM QUE SABER O EMPREGO DAS CONJUNÇÕES. NO CASO EM TELA, A ÚNICA CONJUNÇÃO DIFERENTE É "POR TANTO", SENDO UMA CONJUNÇÃO CONLUSIVA. AS OUTRAS, TODAS SÃO CONJUNÇÕES ADVERSATIVAS: MAS, PORÉM, CONTUDO, TODAVIA NO ENTANTO, ENTRETANTO....

  • orações coordenadas Adversativas: ligam duas orações ou palavras, expressando ideia de contraste ou compensação. São elas: mas, porém, contudo, todavia, entretanto, no entanto, não obstante.

    Tentei chegar mais cedo, porém não consegui.

     Não obstante diante de subjuntivo é concessivo 

    Não obstante diante de presente é adversativo

  •  Aditivas: ligam orações ou palavras, expressando ideia de acrescentamento ou adição. São elas: e, nem (= e não), não só... mas também, não só... como também, bem como, não só... mas ainda. Por exemplo:

    A sua pesquisa é clara e objetiva.

    Ela não só dirigiu a pesquisa como também escreveu o relatório.

    Adversativasligam duas orações ou palavras, expressando ideia de contraste ou compensação. São elas: mas, porém, contudo, todavia, entretanto, no entanto, não obstante. Por exemplo:

    Tentei chegar mais cedo, porém não consegui.

    Alternativas: ligam orações ou palavras, expressando ideia de alternância ou escolha, indicando fatos que se realizam separadamente. São elas: ou, ou... ou, ora... ora, já... já, quer... quer, seja... seja, talvez... talvez. Por exemplo:

    Ou escolho agora, ou fico sem presente de aniversário.

    Conclusivas: ligam a oração anterior a uma oração que expressa ideia de conclusão ou consequência. São elas: logo, pois (depois do verbo), portanto, por conseguinte, por isso, assim. Por exemplo:

    Marta estava bem preparada para o teste, portanto não ficou nervosa.

    Explicativas: ligam a oração anterior a uma oração que a explica, que justifica a ideia nela contida. São elas: que, porque, pois (antes do verbo), porquanto. Por exemplo:

    Não demore, que o filme já vai começar.

  • Eu sempre lembro do Seu Girafales falando mas, porém, contudo, todavia , entretanto hahahaha

  • Por ELIMINAÇÃO:

    Conjunções Adversativas:

    • TODAVIA, NO ENTANTO, ENTRETANTO, CONTUDO, MAS, PORÉM

    Portanto é conjunção conclusiva. Neste caso, a única "diferente". Marquei usando a lógica da exclusão.

  • Todas são conjunções adversativas, salvo Portanto que é conclusiva.

  • Porque essa banca gosta de fazer questões mirabolantes?