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ID
5339389
Banca
Aeronáutica
Órgão
CIAAR
Ano
2021
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

O youtuber e Machado de Assis, ou uma polêmica bem-vinda

Cláudia Costin*


    1§ Uma polêmica apareceu nos últimos dias, nas redes sociais, a partir de um comentário do youtuber Felipe Neto, sobre a atitude de escolas que tornam as obras de Machado de Assis obrigatórias. Segundo ele, o que estas deveriam promover seria a leitura por prazer, de forma a constituir, nas jovens mentes, o hábito de ler como uma atividade para toda a vida.

    2§ Devo me confessar uma grande admiradora de Machado de Assis, um de nossos maiores escritores, um homem à frente de sua época, crítico de valores associados a aparências e à superficialidade humana na busca de status e do bacharelismo vigente. Mas entendi que nem sempre a linguagem do século 19 pode ser fácil para os adolescentes deste tempo de informações imediatas e superficiais.

    3§ Num contexto em que adultos letrados leem muito pouco e não são vistos lendo livros por seus filhos, é compreensível que os jovens não percam tempo lendo outra coisa que não o que a escola lhes exige. A última edição da pesquisa Retratos da Leitura coloca-nos claramente como um país de não leitores. A média de livros lidos entre os entrevistados por ano é de 4,95 e só 2,55 deles lidos por inteiro.

    4§ Cabe sim à escola fomentar a leitura por prazer, oferecendo livros que atraiam o interesse das novas gerações. Em tempos em que o trabalho humano, inclusive o que demanda habilidades mentais, vem sendo substituído por algoritmos, formar pensadores independentes, com um repertório cultural variado, aptos a entender a cultura de seu tempo e sua gênese, torna-se uma prioridade.

    5§ E a literatura nos ajuda a entender não só fatos pretéritos, mas as análises que, a cada época, eram feitas sobre a organização da sociedade. Machado, nesse sentido, é fundamental e merece, dia a dia, uma introdução à altura, instigante e engajadora, feita por bons professores, que orientem os alunos na leitura de suas obras e os ajudem a nelas navegar com profundidade e prazer estético.


* Diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais, da FGV, e ex-diretora de educação do Banco Mundial. Folha de S. Paulo, Opinião, 29 jan. 2021, p. A2. Adaptado. 

“Denomina-se referenciação as diversas formas de introdução, no texto, de novas entidades ou referentes. Quando tais referentes são retomados mais adiante ou servem de base para a introdução de novos referentes, tem-se o que se denomina progressão referencial.”


KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e compreender os sentidos do texto. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2010, p. 123.


O referente do item em destaque está corretamente indicado entre parênteses em

Alternativas
Comentários
  • Para que não errem, como eu errei:

    (A) “...lendo outra coisa não o que a escola lhes exige.” (3§) (lhes = jovens).

    R.: Gabarito. Quem exige, exige alguma coisa (OD) de alguém (OI).

    • "(...) é compreensível que os jovens não percam tempo lendo outra coisa que não o que a escola lhes exige."

    O que a escola exige? Ler. De quem é exigido? Dos jovens!

    • lhe(s) é um pronome oblíquo átono (POA) utilizado quando complementa verbos na função de objeto indireto.

    Assim sendo, seria equivalente a dizer: "(...) que a escola exija dos jovens que leiam (...)".

    (B) “...feita por bons professoresque orientem os alunos...” (5§) (que = fatos).

    R.: Falso. Que é um pronome relativo, que, no caso, funciona como sujeito do verbo orientar, retomando os bons professores.

    (C) “...inclusive o que demanda habilidades mentais...” (4§) (o = repertório cultural).

    R.: Falso. O exerce a função de POA, seria equivalente a dizer trabalho humano.

    • "Em tempos em que o trabalho humano, inclusive o que demanda habilidades mentais, (...)".
    • o(s) é um pronome oblíquo átono (POA) utilizado quando complementa verbos na função de objeto direto.

    (D) “...o que estas deveriam promover...” (1§) (estas = obras de Machado de Assis).

    R.: Falso(?). Veja bem, eu errei essa questão, mas na minha opinião, o avaliador se utilizou de uma infelicidade do autor.

    • "(...), sobre a atitude de escolas que tornam as obras de Machado de Assis obrigatórias. Segundo ele, o que estas deveriam promover seria a leitura por prazer (...)"

    Para o avaliador, o pronome demonstrativo "estas" retoma escolas (?), contudo, lembremos como funciona o referido pronome:

    Pronomes demonstrativos possuem três sentidos: a) temporal; b) espacial; e c) textual. Dentro do contexto, percebe-se que se trata de um sentido textual. Os pronomes este(s), esta(s) e isto, no sentido textual, podem funcionar de duas formas:

    1. antecipando, precedendo um termo que ainda será apresentado, ou seja, função de catáfora; ou
    2. retomando um termo que fora dito, quando diante de três referentes simultâneos, atuando, no caso, como anáfora.

    Por esse motivo, julguei estas estar retomando as obras de Machado de Assis, conquanto o autor teve a intenção, diante do contexto, retomar escolas. Faltou-me atenção, mas não contava com um uso inadequado da norma culta, tanto por uma autora de renomado gabarito, quanto por parte do examinador.

    Obs.: Tenham TOTAL liberdade para me corrigir, caso encontre equívocos.

    -----------------------

    Boa sorte e bons estudos.

  • Caro Luiz Felipe,

    muito boa sua resposta mas venho só acrescentar que o pronome demonstrativo "estas" NÃO TEM FUNÇÃO ANAFÓRICA e sim CATAFÓRIFA. O pronome demonstrativo com função anafórica é o "essa(s) e seus derivados". Pelo menos foi assim que aprendi:

    • ESTE e seus derivados - catafórico
    • ESSE e seus derivados - anafórico

    Quando você diz "Os pronomes este(s)esta(s) e isto, no sentido textual, podem funcionar de duas formas:

    2 - retomando um termo que fora dito, quando diante de três referentes simultâneos, atuando, no caso, como anáfora.", acredito que aqui tem um equívoco.

    Concordo com a infelicidade do erro no texto, que no caso deveria ter sido usado " essas", porém a alternativa "a" está bem certinha quanto à referenciação. Ainda que a letra D contenha o erro que estamos debatendo, claramente o referencial é " escolas" e não "a obra de Machado de Assis".

    Espero ter ajudado...Bons estudos!