...O fato é que os movimentos sociais historicamente conhecidos como campo de luta de
uma sociedade civil organizada voluntariamente dotada de reivindicações democráticas por
direitos contra e pelo Estado estão perdendo seu lugar para um dito “terceiro setor” (até
porque não são considerados inclusos neste fenômeno) que desenvolve uma relação de
parceria harmônica com o Estado e mercado. Por assim dizer, ocorre atualmente mudança de
caráter e significado do que de fato representaram os movimentos sociais fortemente
organizados nos anos de 1980 e 1990. E ainda, aqueles que atualmente são resistentes passam
a não serem considerados pertencentes a mesma categoria “sociedade civil” organizada pelos
neoliberais, de fato por não creditarem das mesmas propostas.
Entretanto, iniciando a década de 1990, os partidários ao “terceiro setor” começam a
ostentar uma nova postura a partir de grandes processos históricos ocorridos no Brasil. A
ONG iniciou uma ação de “despolitização” na sociedade e os movimentos sociais foram
“substituídos” (não em sua maioria, pois fortes movimentos permanecem) por um “terceiro
setor” desenvolvendo assim parceria “escamoteada” com o Estado e o mercado e os
movimentos populares que hoje permanecem organizados em luta não são então considerados
como um campo do “terceiro setor”.
Achei essa citação em uma monografia, a autora se utilizava de Montaño.
www.puro.uff.br/tcc/2012-2/Fernanda%20Oliveira%20Araujo.pdf
Trago a citação de uma dissertação de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Política Social do Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas da Universidade Federal do Espírito Santo, inserido na linha de pesquisa Políticas Sociais, Subjetividades e Movimentos Sociais. O capítulo 2 que trata sobre os movimentos sociais na década de 1990 é muito interessante e traz autores bem conceituados na temática, como o próprio Montaño, assim como a Maria da Glória Gohn.
Identifica-se, como já apresentado por Gohn (2002), uma mudança na relação, existente anteriormente, entre movimento social e ONG. Estas passam a ocupar o lugar dos movimentos sociais, ou seja, de coadjuvante de movimento social, a ONG passa a ocupar o próprio lugar do movimento social (MONTAÑO, 2005). Elas ganham espaço na mídia, maior respaldo e credibilidade social, devido a sua lógica gerencial que, neste contexto, dá-lhe um ar de maior eficiência. Nesse sentido, nos anos 1990 as Ongs crescem em quantidade e em número de membros, enquanto os movimentos sociais seguem o caminho inverso (MONTAÑO, 2005). A relação que estas ONG´s estabelecem com o Estado também é diferente nos anos 1990. Nos anos 1970/1980 essas ONG´s se colocavam ao lado dos movimentos sociais, enquanto estratégia de enfrentamento do sistema e numa relação de conflito com o Estado. Nos anos 1990, de um modo geral, apresentam-se num processo de divórcio com os movimentos sociais e se relacionam com o Estado (e até com empresas em alguns casos) como parceiros. Essa relação, na maioria das vezes, é dócil, despolitizada, despolitizadora e funcional ao projeto neoliberal (MONTAÑO, 2005).
Todas essas mudanças trazem uma série de conseqüências, entre elas: a redução dos movimentos sociais no que diz respeito a número e impacto social; as ONG´s assumem a representatividade das organizações sociais e as demandas populares, mas não se colocam numa relação de luta, de reivindicação, mas de pedido, de negociação e parceria, relegando, quase sempre, a segundo plano, a atividade do movimento social, que é, também, submetido a nova lógica da negociação; esse processo vai causar uma mudança no conteúdo das lutas sociais, tornando a relação com o capital e com Estado mais dócil, não conflitiva, além da despolitizar e esvaziar as organizações populares (MONTAÑO,2005). Nesse sentido, as lutas desencadeadas na sociedade civil atuam em um sentido de substituir ou compensar o que o Estado abandona no contexto neoliberal, ao invés de se constituírem em lutas para preservar e ampliar as conquistas históricas dos trabalhadores (MONTAÑO, 2005). (p.84-85)
Fonte: http://web3.ufes.br/ppgps/sites/web3.ufes.br.ppgps/files/Aracely%20Xavier.pdf