SóProvas


ID
2529898
Banca
COMPERVE
Órgão
UFRN
Ano
2017
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

                                              MOÇA BONITA NÃO PAGA?

                                                                                                                                           Maíra Zapater


      Em junho de 2017, uma juíza do Distrito Federal, ao julgar uma ação proposta por um homem contra os organizadores de uma festa que cobrava preços diferentes para os ingressos de homens e mulheres, declarou ser ilegal a prática. À decisão, seguiu-se agora, em julho, nota técnica da Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça reafirmando a ilegalidade da cobrança diferenciada e ressaltando que os estabelecimentos que não se adaptassem estariam sujeitos às sanções previstas no artigo 56 do Código de Defesa do Consumidor.

      Ambas as determinações geraram polêmica (aliás, como parece acontecer com tudo – ou quase tudo – que envolva demandas feministas relacionadas à desigualdade de gênero). Se até então eram frequentes, nas conversas de bar travadas tanto nas mesas quanto nas redes sociais, afirmações tais como “nunca vi feminista reclamar na hora de entrar de graça ou pagar mais barato na balada!” (em geral proferida com sua gêmea siamesa “na hora de pedir serviço militar obrigatório, as feministas ficam quietas”), agora parece que o jogo virou, e os críticos preferem manifestar sua indignação dizendo que “as feministas querem impor sua ideologia pra todo mundo e obrigar as mulheres a pagarem mais caro na balada”, “vai acabar balada”, “nunca mais ninguém vai sair pra night”, “ninguém vai pegar mais ninguém”, “as feministas vão fazer fechar as casas noturnas” e por aí vai.

      Piadas à parte, e sem entrar no mérito da (in)coerência das críticas, quero, na coluna de hoje, contribuir com argumentos para a discussão, sugerindo duas perguntas para, juntos, pensarmos sobre o assunto. Parece-me ser relevante refletir sobre dois aspectos: primeiro, é discriminatório cobrar preços diferentes para homens e mulheres na balada? E, segundo: se for discriminatório, o estabelecimento (que é privado) tem liberdade de discriminar seu público, cabendo ao consumidor exercer a sua liberdade de frequentar ou não o local conforme suas próprias convicções?

      Os exemplos – ainda que hipotéticos – são sempre úteis para trazer à concretude abstrações por vezes nem tão acessíveis. Então, vamos lá: um exercício sempre eficaz para examinar se a questão de gênero faz ou não diferença em determinada situação é a inversão dos gêneros dos protagonistas. Pois imaginemos que uma determinada balada resolva cobrar mais barato o ingresso dos homens. O dono do estabelecimento justifica a adoção dessa política de preços afirmando preferir que haja maioria de homens no local, porque “como todo mundo sabe, muita mulher junta sempre acaba dando confusão” e que “ninguém gosta de estar numa festa em que só tenha mulher”. “Além disso”, continua ele, “todo mundo sabe que, quando a mulherada sai pra night, só quer saber de pegação e, com certeza, vai preferir ir a um lugar onde tenha o máximo possível de homens para escolher”.

      A situação hipotética pareceu estranha, de alguma forma, com a inversão dos lugares-comuns em geral apresentados para justificar a cobrança mais barata para mulheres? Bom, se a narrativa ganhou conotações diferentes em decorrência dessa inversão, significa que há expectativas diferentes para homens e mulheres colocados em uma mesma situação social e que se construiu ali uma relação desigual entre homens e mulheres – e, portanto, (no mínimo, potencialmente) discriminatória e ilícita, já que a Constituição veda o tratamento desigual entre iguais (vale lembrar que o inciso II do artigo 5º da CF estabelece que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações”, o que só reforça a invalidade jurídica do fator de discriminação com o qual se pretende justificar a cobrança diferenciada).

      Pois bem. Assumindo que concordamos – eu e você, leitora e leitor – que há discriminação na prática de cobrar ingresso mais barato de mulheres nas festas e casas noturnas, resta pensar no segundo questionamento que propus acima: o estabelecimento privado tem a liberdade de adotar uma política considerada discriminatória, cabendo ao público consumidor escolher se quer ou não frequentar o local?

      Ilustremos com outro exemplo hipotético (ou talvez menos fictício do que gostaríamos): imaginemos que o dono de uma casa noturna queira construir uma reputação de que seu estabelecimento seja um local “onde só vai gente bonita”. Para garantir que, segundo seus critérios subjetivos e seu “tino empresarial”, seja mantido um padrão estético mínimo nos frequentadores da casa, esse proprietário estabelece uma “cota máxima” para negros no local, estipulando um número limite de pessoas negras por noite, e determinando, ainda, que pessoas brancas têm direito a um ingresso com desconto. Esse empresário se justifica dizendo o seguinte: “Não é racismo, é só uma questão de gosto. Eu concordo com o padrão hegemônico de beleza que, em geral, vemos nas revistas, novelas e filmes e acho que as pessoas brancas são mesmo mais bonitas e que é muito mais agradável estar numa balada com maioria de pessoas brancas. É só a minha opinião. Quem não concordar e tiver uma opinião diversa, não é obrigado a vir na minha casa noturna”.

      Teria o nosso empresário hipotético a liberdade de adotar uma política discriminatória por entender ser a mais lucrativa para o seu estabelecimento? 

      Aqui tocamos no sensível ponto dos limites entre a liberdade no campo privado e o dever de atuação do Estado quando há uma violação de direitos humanos entre particulares – sim, discriminar em razão de cor, raça, religião, gênero, orientação sexual etc. viola o direito à igualdade. Da mesma forma que a discriminação racial do segundo exemplo, a discriminação de gênero é também uma forma de violação – ainda que pareça vir disfarçada do “privilégio” de pagar mais barato um ingresso.

      A ideia de uma presença majoritária de mulheres diz respeito a um tipo específico de balada, na qual, seguramente, as mulheres não gozam das mesmas prerrogativas de liberdade sexual que os homens – será que as moças que “saem pra pegação” são socialmente vistas da mesma maneira que os meninos na mesma situação? Ao defender a possibilidade de manutenção de cobrança diferenciada para mulheres, não estaremos a reafirmar estereótipos profundamente prejudiciais? E, de mais a mais, não é com essa alteração que “a balada ficou cara”, não é mesmo? Que tal revermos toda essa política de preços na qual se vendem “experiências” – e, claro, vai e paga quem pode e quem quer – mas tornando esse espaço de acesso público friendly* para mulheres da mesma forma que para os homens? 

Disponível em:<http://justificando.cartacapital.com.br> . Acesso em: 11 jul. 2017.

*friendly = amigável 

Considere o período:


Assumindo que concordamos (1º) – eu e você, leitora e leitor – que há discriminação na prática de cobrar ingresso mais barato de mulheres nas festas e casas noturnas, resta (2º) pensar (3º) no segundo questionamento que propus (4º) acima [...].


Nesse período, o verbo da oração principal é o

Alternativas
Comentários
  • E sobre o verbo concordamos?

  • Tatiane Marques, o concordamos faz parte da oração subordinada substantiva, perceba que o QUE é conjunção integrante Assumimos ISSO.

     

    Assumindo (ISSO)  que concordamos (1º) – eu e você, leitora e leitor – que há discriminação na prática de cobrar ingresso mais barato de mulheres nas festas e casas noturnas, resta (2º) pensar (3º) no segundo questionamento que propus (4º) acima [...]. 

     

    Acredito que a ordem direta seja essa:

     

    Pensar no segundo questionamento que propus (4º) acima [...] (sujeito oracional) RESTA, assumindo (ISSO) que concordamos – eu e você, leitora e leitor – que há discriminação na prática de cobrar ingresso mais barato de mulheres nas festas e casas noturnas.

     

    Caso esteja equivocada, avisem-me.

  • O negócio é o seguinte, curto e grosso, direto ao ponto.  

     

    Se houver no período uma conjunção integrante ou um pronome relativo, consequentemente o verbo de sua oração não pertence à oração principal, visto que ele introduz uma oração subordinada. 

     

    Cabe ,agora, a nós descobrir qual dos 2 verbos da locução verbal é o principal: resta ou pensar. 

    Verbos auxiliares são aqueles que entram na formação dos tempos compostos e das locuções verbais.

    O verbo principal, quando acompanhado de verbo auxiliar, é expresso numa das formas nominais: infinitivo, gerúndio ou particípio.

    Por exemplo: 
                              Vou                       espantar           as          moscas.

                       (verbo auxiliar)       (verbo principal no infinitivo)

     

                          Está                            chegando                      a         hora     do    debate.

                   (verbo auxiliar)      (verbo principal no gerúndio)      

     

    Contudo, nesse período, o exercício não pede o verbo principal da locução, mas o verbo que pertence a oração principal, o verbo da oração principal é o que conjuga-a.  O verbo pensar faz parte, sintaticamente,  da oração.          Resta <ISSO>       ou         ISSO <Resta>.

     

    Gabarito alternativa D

     

     

     

  • Obrigada, Vivi!

  • Maçete simples:

    Os verbos que são antecedidos de conjução integrante (que, se) não fazem parte da oração principal;

    As locuções verbais, que é este o caso, o primeiro verbo é o principal, salvo se for o verbo da voz passiva "ser", neste caso será o segundo.

     

    Matei essa assim!

     

    Deus abençoe vocês!

  • Gente, vamos pedir para o professor comentar essa questão.


  • Gente, vamos pedir para o professor comentar essa questão.


  • Verbos antecedidos por conjunções integrantes não são da oração principal
  • No primeiro, temos o verbo dentro de uma Oração Subordinada Substantiva Objetiva;

    No segundo, o verbo da Oração Principal;

    No terceiro, Oração Subordinada Substantiva Objetiva Direta Reduzida de Infinitivo;

    No quarto, temos uma Oração Subordinada Adjetiva Restritiva.

    ======COLOCAREI A SEGUIR O PERÍODO EM QUE TODAS AS ORAÇÕES ESTARÃO EM SUA FORMA DESENVOLVIDA======

    Resta que se pense no segundo questionamento que propus acima assumindo que concordamos (1o) – eu e você, leitora e leitor – que há discriminação na prática de cobrar ingresso mais barato de mulheres nas festas e casas noturnas.

  • Peçam comentário do professor! Pfv!