SóProvas


ID
2841265
Banca
FEPESE
Órgão
CIASC
Ano
2017
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Texto 1

Escutatória


Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular.


Escutar é complicado e sutil. Diz o Alberto Caeiro que “não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. É preciso também não ter filosofia nenhuma”. Filosofia é um monte de ideias, dentro da cabeça, sobre como são as coisas. Aí a gente que não é cego abre os olhos. Diante de nós, fora da cabeça, nos campos e matas, estão as árvores e as flores. Ver é colocar dentro da cabeça aquilo que existe fora. As árvores e as flores entram. Mas – coitadinhas delas – entram e caem num mar de ideias. São misturadas nas palavras da filosofia que moram em nós. Perdem a sua simplicidade de existir. Ficam outras coisas. Então, o que vemos não são as árvores e as flores. Para se ver é preciso que a cabeça esteja vazia.


Parafraseio o Alberto Caeiro: “Não é bastante ter ouvidos para se ouvir o que é dito. É preciso também que haja silêncio dentro da alma.” Daí a dificuldade: a gente não aguenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor, sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer. Como se aquilo que ele diz não fosse digno de consideração e precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer, que é muito melhor. Certo estava Lichtenberg – citado por Murilo Mendes: “Há quem não ouça até que lhe cortem as orelhas.” Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil da nossa arrogância e vaidade: no fundo, somos os mais bonitos…


Há grupos religiosos cuja liturgia consiste de silêncio. Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de pensamentos. E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir coisas que não ouvia. Fernando Pessoa conhecia a experiência, e se referia a algo que se ouve nos interstícios das palavras, no lugar onde não há palavras. É música, melodia que não havia e que quando ouvida nos faz chorar. A música acontece no silêncio. É preciso que todos os ruídos cessem. No silêncio, abrem-se as portas de um mundo encantado que mora em nós – como no poema de Mallarmé, A catedral submersa, que Debussy musicou. A alma é uma catedral submersa. No fundo do mar – quem faz mergulho sabe – a boca fica fechada. Somos todos olhos e ouvidos.

ALVES, R. Escutatória <<http://www.institutorubemalves.org.br/rubem-alves/carpe-diem/cronicas/escutatoria-3/>>, Acesso em 26/08/2017. [Adaptado]

Identifique abaixo as afirmativas verdadeiras ( V ) e as falsas ( F ) considerando o trecho abaixo extraído do 1° parágrafo do texto 1.


Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular.


( ) As frases estabelecem, em sequência de duas a duas (a primeira com a segunda, a terceira com a quarta, a quinta com a sexta) relação semântica de contraste ou adversidade.

( ) Nas duas primeiras frases, os termos “cursos de oratória” e “curso de escutatória” estão no plural e no singular, porque devem concordar, respectivamente, com o adjetivo anteposto, que é o termo regente.

( ) Nas frases, os tempos verbais remetem a situações presentes, passadas e futuras.

( ) As duas últimas frases podem ser reescritas como “Pensei em oferecer um curso de escutatória; acho, contudo, que ninguém vai se matricular.”, sem prejuízo de significado e sem ferir a norma culta da língua escrita.

( ) Os sujeitos das frases se alternam entre a primeira pessoa do singular e a terceira pessoa do plural.


Assinale a alternativa que indica a sequência correta, de cima para baixo

Alternativas
Comentários
  • C

    GAB [C] V • F • V • V • F

  • ( ) As frases estabelecem, em sequência de duas a duas (a primeira com a segunda, a terceira com a quarta, a quinta com a sexta) relação semântica de contraste ou adversidade.


    CORRETA.

    Basta inserir qualquer conjunção adversativa e verificar que mantém o sentido da frase.


    ( ) Nas duas primeiras frases, os termos “cursos de oratória” e “curso de escutatória” estão no plural e no singular, porque devem concordar, respectivamente, com o adjetivo anteposto, que é o termo regente.


    FALSA.

    Anunciados não é adjetivo.


    ( ) Nas frases, os tempos verbais remetem a situações presentes, passadas e futuras.


    CORRETA.


    ( ) As duas últimas frases podem ser reescritas como “Pensei em oferecer um curso de escutatória; acho, contudo, que ninguém vai se matricular.”, sem prejuízo de significado e sem ferir a norma culta da língua escrita.


    CORRETA.

    Substituiu a conjunção adversativa "mas" por um "contudo" intercalado.


    ( ) Os sujeitos das frases se alternam entre a primeira pessoa do singular e a terceira pessoa do plural.


    FALSA

    Primeira e terceira do singular.


  • A) CORRETA


    Se colocarmos um "mas" antes de cada frase adversativa fica mais claro perceber


    B) ERRADA


    Não se trata de adj., e sim de adjunto adverbial de modo: o modo como eu vejo os cursos de oratório (anunciados)


    C) CORRETO


    Temos os verbos "vejo", "vi" e "vai"


    D) CORRETA


    O uso do ";" é permitido quando temos separação de duas orações em que ou a conjunção conclusiva ou a adversativa (nosso caso: "contudo") esteja deslocada (entre vírgulas)


    E) ERRADA


    Temos sim sujeitos na 1ª do singular, mas não na 3ª; o que temos, portanto, são pronomes indefinidos: "Todo Mundo" e "Ninguém"

  • GAB [C] V • F • V • V • F

  • Sobre o item:

    "( ) Nas frases, os tempos verbais remetem a situações presentes, passadas e futuras."

    O verbo vai está no presente do indicativo.

    Afinal, qual é o verbo que remete ao futuro

  • Ana Paula Garcia a locução verbal "pensei em oferecer"traz uma acepção semântica de futuro, embora a construção seja pretérito perfeito do indicativo+infinitivo

  • GABARITO: C

  • Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular.

    (v) As frases estabelecem, em sequência de duas a duas (a primeira com a segunda, a terceira com a quarta, a quinta com a sexta) relação semântica de contraste ou adversidade.

    (F ) Nas duas primeiras frases, os termos “cursos de oratória” e “curso de escutatória” estão no plural e no singular, porque devem concordar, respectivamente, com o adjetivo anteposto, que é o termo regente.

    Não se trata de adjetivo, e sim de adjunto adverbial de modo: o modo como eu vejo os cursos de oratório (anunciados)

    (V) Nas frases, os tempos verbais remetem a situações presentes, passadas e futuras.

    (V) As duas últimas frases podem ser reescritas como “Pensei em oferecer um curso de escutatória; acho, contudo, que ninguém vai se matricular.”, sem prejuízo de significado e sem ferir a norma culta da língua escrita.

    (F ) Os sujeitos das frases se alternam entre a primeira pessoa do singular e a terceira pessoa do plural.

    Temos sim sujeitos na 1ª do singular, mas não na 3ª; o que temos, portanto, são pronomes indefinidos: "Todo Mundo" e "Ninguém"

  • "Vai" é presente do indicativo na terceira pessoa. Não é futuro.

    Certo??

  • As duas últimas frases podem ser reescritas como “Pensei em oferecer um curso de escutatória; acho, contudo, que ninguém vai se matricular.”, sem prejuízo de significado e sem ferir a norma culta da língua escrita.

    Alguém sabe me falar por que essa colocação pronominal não está errada? Já que o "ninguém" atrai próclise. Creio que deveria vir antes do "vai" ou depois do infinitivo.