SóProvas


ID
5598148
Banca
CPCON
Órgão
Prefeitura de Sousa - PB
Ano
2021
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Leia o texto abaixo e, em seguida responda à questão


O ceguinho (Stanislaw Ponte Preta)


    No duro mesmo só existiriam dois tipos de cegos: o de nascença e o que ficou cego em vida. Mas, como diz Primo Altamirando, contrariando a chamada voz popular, Deus põe e o homem dispõe. Assim, há um terceiro tipo de cego que nenhum oftalmologista, seja qual for a amplitude de seus conhecimentos oftalmológicos, jamais poderá curar: o cego por necessidade.

    E que o leitor mais apressado pouquinha coisa não pense que estou me referindo àquele tipo de camarada que se encaixa perfeitamente no dito "o pior cego é o que não quer ver", porque este é cego por metáfora, enquanto que o terceiro tipo de cego, isto é, o cego por necessidade, é considerado por todos como cego no duro, às vezes com carteirinha de cego e tudo.

    Seu Júlio, que hoje é lavador de automóveis (e entre os automóveis que lava, lava o meu), já foi cego por necessidade. Começou sua carreira na porta da Igreja de Nosso Senhor do Bonfim (agora Matriz de Nossa Senhora de Copacabana). Seu Júlio, artista consciencioso, era um cego perfeito e ganhava esmola às pampas.

    - E o senhor sempre trabalhou como cego, seu Júlio?

    - Não senhor. Eu comecei perneta, sim senhor.

    - Perneta?

    - Usava perna de pau. Quem me ensinou foi um cigano meu amigo. Agente botando uma calça larga o truque é fácil de fazer.

    Mas, como perneta, seu Júlio um dia teve uma contrariedade. Apareceu pela aí um chefe de polícia com intenções de endireitar o Brasil e foi chato. Organizou uma campanha de perseguição à mendicância e seu Júlio entrou bem. Quando o carro da polícia, mais conhecido na linguagem policial como viatura, parou na porta da igreja, mendigo que podia se pirou, mas seu Júlio não pôde correr de calça larga e perna de pau, que a tanta perfeição não chegaram os engodos do cigano. Seu Júlio foi em cana.

    - E quando saiu das grades?

    - Virei cego por necessidade. Treinei uns dois meses em casa, passando dia e noite com uma venda nos olhos. Fiquei bárbaro em trejeito de cego. A pessoa podia fazer o maior barulho do meu lado, que eu nem me virava pra ver o que tinha acontecido. Fiquei um cego tão legal que um dia houve um desastre bem em frente à igreja. Um carro bateu num caminhão da Cervejaria Brahma e caiu garrafa pra todo lado. Foi um barulho infernal. Pois eu fiquei impávido. Nem me mexi.

    Quando seu Júlio me contou esta passagem, notei o orgulho estampado em seu semblante. Era como um velho ator a contar, numa entrevista, a noite em que a plateia interrompeu seu trabalho com aplausos consagradores em cena aberta. Era como um veterano craque de futebol a descrever para os netos o gol espetacular que fizera e que deu às suas cores o campeonato daquele ano.

    - Como cego o senhor nunca foi em cana, seu Júlio?

    - Nunquinha. Sabe como é... Cego vê longe. Mal surgia um polícia suspeito eu me mandava a 120.

    - E por que abandonou a carreira de cego?

    - Concorrência desleal.

    E explica que, no tempo dele, não havia essa coisa de alugar criança subnutrida para pedir esmola. Depois que apareceram as mães de araque, o cego tornou-se quase obsoleto no setor da mendicância. Apolícia também, hoje em dia, é praticamente omissa.
    - E sendo a polícia omissa, dá muito mais mendigo à saída da missa diz seu Júlio, sem evitar o encabulamento pelo trocadilho infame. Toda essa desorganização administrativa levou-o a abandonar a carreira de cego por necessidade.

    Nos países subdesenvolvidos a mendicância é uma miséria. Seu Júlio que o diga. Era um cego dos melhores, mas largou a carreira na certeza de que, mais dia menos dia, vai ter muito mais gente pedindo do que dando esmola. (Acontece na cidade/ Carlos E. Novaes [et. al.], S. Paulo: Ática, 2005)

Analise as explicações a seguir com relação a alguns recursos linguísticos presentes no texto e assinale (V) para as proposições verdadeiras e (F) para as falsas.


( ) Em: “No duro mesmo só existiriam dois tipos de cegos: o de nascença e o que ficou cego em vida.”, o item “o” se classifica como pronome demonstrativo.

( ) Em: “Não pense que estou me referindo àquele tipo de camarada que se encaixa perfeitamente no dito "o pior cego é o que não quer ver", porque este é cego por metáfora, enquanto que o terceiro tipo de cego, isto é, o cego por necessidade, é considerado por todos como cego no duro,[...]”, os conectivos “porque” e “enquanto que” podem ser substituídos, sem prejuízo semântico, por “pois” e “mas”, respectivamente.

( ) Em: “Seu Júlio, que hoje é lavador de automóveis (e entre os automóveis que lava, lava o meu), já foi cego por necessidade”, a expressão “Seu Júlio”, que inicia o parágrafo, assume a função de vocativo na frase.

( ) Na resposta apresentada pelo personagem: “ – (Eu)Virei cego por necessidade”, o termo “cego” assume, na frase, a função de objeto direto e a unidade “por necessidade”, de adjunto adverbial de causa.


A sequência CORRETAse apresenta em:

Alternativas
Comentários
  • ( V ) Em: “No duro mesmo só existiriam dois tipos de cegos: o de nascença e o que ficou cego em vida.”, o item “o” se classifica como pronome demonstrativo.

    ( V ) Em: “Não pense que estou me referindo àquele tipo de camarada que se encaixa perfeitamente no dito "o pior cego é o que não quer ver", porque este é cego por metáfora, enquanto que o terceiro tipo de cego, isto é, o cego por necessidade, é considerado por todos como cego no duro,[...]”, os conectivos “porque” e “enquanto que” podem ser substituídos, sem prejuízo semântico, por “pois” e “mas”, respectivamente.

    ( F) Em: “Seu Júlio, que hoje é lavador de automóveis (e entre os automóveis que lava, lava o meu), já foi cego por necessidade”, a expressão “Seu Júlio”, que inicia o parágrafo, assume a função de vocativo na frase.

    ( F ) Na resposta apresentada pelo personagem: “ – (Eu)Virei cego por necessidade”, o termo “cego” assume, na frase, a função de objeto direto e a unidade “por necessidade”, de adjunto adverbial de causa.

  • GABARITO LETRA E

  • Gabarito na alternativa E

    Solicita-se julgamento das assertivas:

    (V) Em: “No duro mesmo só existiriam dois tipos de cegos: o de nascença e o que ficou cego em vida.”, o item “o” se classifica como pronome demonstrativo.

    Nas duas ocorrências, acompanhados pela preposição "de" e pelo pronome relativo "que", os termos "o" em destaque são formas pronominais demonstrativas que retomam um referente anafórico, amplamente substituíveis pelas formas "aquele(a)(s)".

    (V) Em: “Não pense que estou me referindo àquele tipo de camarada que se encaixa perfeitamente no dito "o pior cego é o que não quer ver", porque este é cego por metáfora, enquanto que o terceiro tipo de cego, isto é, o cego por necessidade, é considerado por todos como cego no duro,[...]”, os conectivos “porque” e “enquanto que” podem ser substituídos, sem prejuízo semântico, por “pois” e “mas”, respectivamente.

    Os termos destacados na passagem original, "porque" e "enquanto", são conjunções, respectivamente explicativa e adversativa.

    Sobre o uso da conjunção "enquanto" e da locução "enquanto que", Domingos Paschoal Cegalla em seu Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa assevera:

    "A conjunção enquanto une orações que expressam: a) fatos simultâneos: Malha-se o ferro enquanto está quente. b) fatos opostos: Uns trabalham enquanto outros se divertem.

    No segundo caso, para que o contraste entre os dois fatos fique bem nítido, pode-se usar, em vez de enquanto, a locução enquanto que, equivalente a ao passo que: Uns trabalham enquanto que outros se divertem. / Somente alguns criminosos foram presos, enquanto que a maioria deles continua em liberdade."

    Do exposto, observa-se que a substituição da conjunção "porque" pela também explicativa "pois" e da locução de valor opositivo "enquanto que" pela conjunção adversativa "mas" não causam prejuízos semânticos à passagem, consoante se pode observar na reescrita da passagem:

    "(...) porque este é cego por metáfora, enquanto que o terceiro é(...)"

    "(...) pois este é cego por metáfora, mas o terceiro é (...)"

    (F) Em: “Seu Júlio, que hoje é lavador de automóveis (e entre os automóveis que lava, lava o meu), já foi cego por necessidade”, a expressão “Seu Júlio”, que inicia o parágrafo, assume a função de vocativo na frase.

    Não há valor vocativo na expressão, seguida de vírgulas por conta da oração adjetiva explicativa que a acompanha.

    Suprimida fosse a oração virgulada após "Júlio", desapareceriam as vírgulas da passagem (Seu Júlio já foi cego...).

    (F) Na resposta apresentada pelo personagem: “ – (Eu)Virei cego por necessidade”, o termo “cego” assume, na frase, a função de objeto direto e a unidade “por necessidade”, de adjunto adverbial de causa.

    A forma verbal "virar" é copulativa, leia-se liga uma característica ao seu sujeito, sendo o termo "cego" classificado como predicativo do sujeito, não complemento verbal.

  • Onde que "enquanto" é adversativa??????? Que eu saiba é temporal e por mim essa alternativa é falsa, pois muda total o sentido.

  • Português é dos inferno

  • Estou pegando raiva de Português

  • Faço parte das estatísticas que considerou a última alternativa como verdadeira:

    Pensei: EU VIREI CEGO

    Quem vira, vira ALGO. VTD e OBJ DIR.

    ( ) Na resposta apresentada pelo personagem: “ – (Eu)Virei cego por necessidade”, o termo “cego” assume, na frase, a função de objeto direto e a unidade “por necessidade”, de adjunto adverbial de causa.

    Grande peguinha banca, o verbo VIRAR pode possuir inúmeros significados e dependendo do seu contexto pode assumir transitividade diferente.

    No caso em tela: temos um verbo predicativo

    Transformar-se numa outra coisa; mudar sua essência ou característica por; transformar-se: virou famosa da noite para o dia; virou uma péssima pessoa antes de morrer.

    VIROU CEGO = TORNOU-SE CEGO!

    Sendo assim, conforme bem exposto pelo comentário do Ivan Lucas:

    A forma verbal "virar" é copulativa, leia-se liga uma característica ao seu sujeito, sendo o termo "cego" classificado como predicativo do sujeito, não complemento verbal.

    Então guarde: o verbo VIRAR pode ser transitivo direto, intransitivo e pronominal.

    Estudo complementar: >>> https://www.dicio.com.br/virar/

    Gabarito: letra e

  • Quando que enquanto virou adversativa?

  • meu pai amado

  • Enquanto é conjunção temporal e não adversativa.

    Tem algo errado aí....

  • Seu Júlio n é vocativo ?

  • O que aconteceu aqui ?

    Diogo França