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A Corte Interamericana decidiu que a Lei de Anistia editada no Brasil é inválida (Caso Lund), de modo que o ordenamento brasileiro está obtuso em relação à defesa dos direitos humanos diante da prática de tortura, em especial ocorrida no período militar. Há dissenso sobre se a decisão da Corte Interamericana deve ou não se sobrepor à do STF que julgou válida a lei brasileira de anistia. Neste contexto, trazemos o entendimento do Professor André de Carvalho Ramos in ?Processo Internacional de Direitos Humanos?: não há conflito insolúvel entre as decisões do STF e da Corte de San José, uma vez que ambos os tribunais tem a grave incumbência de proteger os direitos humanos. Eventuais conflitos são apenas conflitos aparentes,fruto do pluralismo normativo que assola o mundo de hoje, aptos a serem solucionados pela via hermenêutica. Pelo exposto, é possível concluir que, tecnicamente, não há que se falar em ?incompatibilidade? entre as decisões do STF na ADPF 153 e da Corte IDH no caso Gomes Lund. OBS.:o problema é contra a concessão de Anistia.A Graça e o Indulto não tem o condão de ofender a CADH.Corte Interamericana meteu Lund na Anistia, em que pese STF tinha julgado válida
Abraços
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"4. A lei estendeu a conexão aos crimes praticados pelos agentes do Estado contra os que lutavam contra o Estado de exceção; daí o caráter bilateral da anistia, ampla e geral, que somente não foi irrestrita porque não abrangia os já condenados --- e com sentença transitada em julgado, qual o Supremo assentou --- pela prática de crimes de terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal." (ADPF 153)
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SOBRE O CASO GOMES LUND E OUTROS VS. BRASIL (também conhecido como “GUERRILHA DO ARAGUAIA”), julgado pela CIDH em 2010:
Houve um conflito na região do Araguaia durante a ditadura em que 70 (setenta) guerrilheiros ficaram desaparecidos e poucas famílias conseguiram encontrar os corpos de seus familiares depois de anos perseguindo na justiça federal brasileira. Em razão do tamanho da região, as testemunhas não sabiam dizer onde se encontravam os corpos que ficaram desaparecidos (cemitérios clandestinos).
Apesar de ter ocorrido na déc. de 70, a partir do momento que o Brasil aceita a competência contenciosa da CIDH, em razão dos corpos continuarem desaparecidos, entendeu-se que a violação dos direitos humanos ainda estava acontecendo e, dessa forma, a Corte Interamericana interveio no caso.
Como o Brasil não conseguiu fazer o controle de convencionalidade estipulado pela lei Internacional de Direitos Humanos, a corte avocou para si a competência do controle de convencionalidade.
No primeiro semestre de 2010 o STF validou a lei da anistia e, no final do mesmo ano, a Corte Interamericana declara a lei de anistia inválida e condena o Brasil a anulá-la, entendendo ser inconvencional e, portanto, sem validade no plano Internacional dos Direitos Humanos. Dessa forma, a lei de anistia foi anulada. Não tem validade anistiar torturador. A decisão tem efeito de coisa julgada no Brasil e como res interpretata para os demais países da CADH. A Corte Interamericana, além de invalidar a lei de anistia (por violar direitos humanos), impôs as seguintes sanções/responsabilidades ao Brasil:
- Devem-se abrir os arquivos da ditadura militar brasileira e dar conhecimento do que houve ao cidadão;
- Criar uma comissão da verdade no país.
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O MPF, em alguns lugares, tem tentado processar e condenar alguns agentes do Estado da época da Ditadura. Porém, esses Procuradores não ganham capa da Veja e os processos tem dificuldade de andamento.
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Para os não assinantes: LETRA A
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Assertiva A
Segundo o STF, a Lei estendeu a conexão aos crimes praticados pelos agentes do Estado contra os que lutavam contra o Estado de exceção; daí o caráter bilateral da anistia. Enquanto que, para a Corte Interamericana de Direitos Humanos, as disposições da Lei de Anistia brasileira não podem continuar a representar um obstáculo para a investigação dos fatos nem para a identificação e punição dos responsáveis.
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Anistia, de 1979, os culpados por esses crimes e outros durante o regime militar foram isentos de punição. Embora a lei tenha sido considerada constitucional pelo STF, ela foi considerada inconvencional pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, uma vez que conflitava com as convenções sobre o tema ratificadas pelo Brasil. Portanto, a sentença do caso em tela estabeleceu, dentre outras obrigações, o dever do governo brasileiro de investigar e punir os culpados pelos crimes cometidos no caso Araguaia (Caso Gomes Lund – Guerrilha do Araguaia). Como os crimes cometidos violaram normas de jus cogens, o dever de investigar e punir também possui caráter de norma imperativa, pois, se isso não for feito, estar-se-á perpetuando a violação dessas normas, ao permitir que tais crimes continuem sem investigação e impunes
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Lei 6.683/1979, a chamada "Lei de Anistia". (...) A lei estendeu a conexão aos crimes praticados pelos agentes do Estado contra os que lutavam contra o Estado de exceção; daí o caráter bilateral da anistia, ampla e geral, que somente não foi irrestrita porque não abrangia os já condenados – e com sentença transitada em julgado, qual o Supremo assentou – pela prática de crimes de terrorismo, assalto, sequestro e atentado pessoal. (...) É a realidade histórico-social da migração da ditadura para a democracia política, da transição conciliada de 1979, que há de ser ponderada para que possamos discernir o significado da expressão "crimes conexos" na Lei 6.683. É da anistia de então que estamos a cogitar, não da anistia tal e qual uns e outros hoje a concebem, senão qual foi na época conquistada. Exatamente aquela na qual, como afirma inicial, "se procurou" [sic] estender a anistia criminal de natureza política aos agentes do Estado encarregados da repressão. (...) A anistia da lei de 1979 foi reafirmada, no texto da EC 26/1985, pelo poder constituinte da Constituição de 1988. Daí não ter sentido questionar-se se a anistia, tal como definida pela lei, foi ou não recebida pela Constituição de 1988; a nova Constituição a [re]instaurou em seu ato originário. (...) A nova ordem compreende não apenas o texto da Constituição nova, mas também a norma-origem. No bojo dessa totalidade – totalidade que o novo sistema normativo é – tem-se que "[é] concedida, igualmente, anistia aos autores de crimes políticos ou conexos" praticados no período compreendido entre 2-9-1961 e 15-8-1979. Não se pode divisar antinomia de qualquer grandeza entre o preceito veiculado pelo § 1º do art. 4º da EC 26/1985 e a Constituição de 1988.
[, rel. min. Eros Grau, j. 29-4-2010, P, DJE de 6-8-2010.]
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No caso Gomes Lund (Guerilha do Araguaia) vs. Brasil o Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por violar inúmeros direitos previstos na Convenção Americana de Direitos Humanos, dentre eles o dever de investigar e punir violações dos direitos humanos.
O caso dizia respeito a várias pessoas que compunham a Guerrilha do Araguaia que, na época da ditadura, praticaram atos de resistência e sofreram DESAPARECIMENTO FORÇADO. A Justiça brasileira não investigou os referidos crimes e, até hoje, não se sabe a localização dos eventuais cadáveres e os responsáveis pelo desaparecimento. Neste caso, a Corte Interamericana de Direitos Humanos decidiu que o Brasil não pode alegar PRESCRIÇÃO, anistia ou outros motivos para não investigar e punir os fatos aqui expostos, considerando, portanto, que a Lei de Anistia brasileira viola o DIREITO À VERDADE, à MEMÓRIA e à Justiça, seguindo jurisprudência consolidada da Corte em outros casos como Chile (Almonacid Arellano e outros Vs. Chile) e Argentina.
Esta decisão entrou em choque com a decisão tomada pelo STF na ADPF 153, que considerou que a Lei da Anistia do Brasil é CONSTITUCIONAL pelo fato de ser bilateral, ou seja, estendida aos MILITARES e aos GUERRILEIROS e por se tratar de um pacto que significou muito para a redemocratização.
Neste contexto, se insere a teoria do Duplo Controle/Crivo, criada por André de Carvalho Ramos, que explica que há, no atual ordenamento jurídico brasileiro, uma dupla compatibilização vertical dos atos normativos, que agora não devem obedecer somente a Constituição, mas também os tratados internacionais de direitos humanos para que sejam considerados válidos. Assim, se determinada lei é compatível com a Constituição, mas viola tratado de direitos humanos a referida lei não passou incólume sobre o crivo do duplo controle, devendo ser declarada inválida. Da mesma forma, se a lei é compatível com o tratado internacional, mas viola a Constituição, ela também será considerada inválida.
No caso da Lei de Anistia brasileira, destaca-se que ela sobreviveu intacta ao primeiro filtro, mas foi rechaçada no âmbito do controle de convencionalidade de matriz externa, o que, segundo a referida teoria, impediria sua aplicação em âmbito interno e determinaria, como consequência, o cumprimento da sentença da Corte-IDH pelo Brasil.
Adotando-se esta teoria não se pode falar que a soberania do Brasil foi violada, porque haverá situações em que a decisão a ser aplicada será a da Corte Interamericana de Direitos Humanos e em outros a decisão que prevalecerá será a do STF. A isso André de Carvalho Ramos chama de Diálogo das Cortes, em que os tribunais nacionais e internacionais dialogam, as vezes convergindo em determinados casos e em outros divergindo, mas sempre atentos às posições uns dos outros.