Cumulonimbus-informáticos
Há, pairando sobre nossas cabeças, gigantescas nuvens informacionais, ameaçando-nos com seus raios,
trovões e ventanias. As tormentas já iniciam suas precipitações e começam a cair sobre nós. Nós somos o seu
elemento. A faísca que produz o ribombar do trovão e a própria tempestade.
1. Que estamos fazendo com nossos sistemas cibernético-informacionais? Acaso paramos de pensar
autonomamente com nossas próprias cabeças? Quiçá cessamos de procurar e manter o conhecimento por nós
mesmos, intuitivamente, sensivelmente, abdutivamente, humanamente – como sempre fizemos, indagamos –,
de buscar o sentido, o significado, a importância e a razão seminal de tudo que há à nossa volta? Daquilo que
foi concebido, refletido e significado axiologicamente através dos tempos imemoriais, entregando tudo isso “de
bandeja” – o melhor de nós e de nossa civilização – às máquinas e aos sistemas informacionais que nós mesmos
construímos e usamos? Seria isso – resumidamente – o que está a ocorrer conosco nesses dias velozes e
acríticos que vivemos na atualidade?
2. Você que me lê, por exemplo, nesse exato momento, não tem mais sequer que pensar, raciocinar,
localizar-se por si, com livre arbítrio e autonomia, pois há – certamente – um aplicativo muito prático e conveniente
fazendo isso por você, e muito mais, o tempo todo. Substituindo-nos acintosamente, explicitamente, trivialmente,
das tarefas mais banais até às mais complexas, delicadas e especializadas. E nós ainda nos tranquilizamos em
saber que, se ocorrer algo de fato importante no nosso planeta, e até fora dele, seremos informados de imediato.
3. O sistema faz isso quase que automaticamente. Do mesmo modo que não é mais necessário também
guardar, anotar ou memorizar nomes e sobrenomes do dia a dia das relações societais, ou ainda direções e
caminhos a serem trilhados nas urbes ou fora delas. O mesmo acontece com os dados e as imagens, pois
certamente seu celular ou seu tablet pretensamente inteligentes, grandes feras no assunto, fazem isso e muito
mais por você.
4. Uma delícia – convenhamos – e uma tragédia também. Sim, pois na cibercultura, a verdade, a notícia,
o valor, a relevância – e, no extremo, o significado, não têm caráter único, sofrem alterações e são ditados
pelo sistema e seus incontáveis aparatos. Todavia, o fato refutável que não pode ser ignorado é que estamos
completamente deslumbrados com o que criamos, e que acolhemos essas novas tecnologias sem o menor
sacrifício.
5. Não sabemos praticamente quase nada acerca desse novo modo de viver que começamos a cristalizar.
Mas é em rede que nos reconhecemos, mensuramos nossas necessidades. E quem não souber decifrar os seus
sinais e signos será, simplesmente, tragado por suas imposições, contingências e ressignificações cada vez
mais presentes. O que não pode deixar de ser percebido é que uma ubiquidade onipresente está transformando
significativamente as relações sociais. E o faz rapidamente. Não é algo simplesmente bom ou ruim, é simplesmente
diferente e está marcando a nossa época, os nossos hábitos, a nossa cultura e os nossos tempos.
6. Bem depois, quando tudo se autodeterminar e se acalmar, em conformidade diametral com as
sensibilidades sociais, é que nós poderemos – talvez – verificar o que sobrou do nosso antigo e milenarizado mundo
não informatizado, analógico e enciclopédico, aquele ao qual estávamos tão confortavelmente acostumados, e,
também, sermos capazes de mensurar que outro mundo novo é esse – cibertecnologizado – que edificamos em
seu lugar, mesmo que sejamos críticos em relação a ele ou que nos cause desconforto. O resto são arbitrariedades
ou especulações.
(QUARESMA, Alexandre. Cumulonimbus-Informáticos. Revista Sociologia, ano VII, edição 67, p. 65 – Adaptado
Neologismo é um fenômeno que consiste na criação de uma palavra ou de uma expressão novas, portanto,
ainda não dicionarizadas, ou na atribuição de um novo sentido a um vocábulo já existente na língua, com
a finalidade de enriquecer o patrimônio linguístico de um povo. O título do texto a seguir exemplifica esse
fenômeno.
“Cumulonimbus-informáticos” indica, metafórica e simbolicamente, uma grande tormenta se aproximando do
homem contemporâneo, que experimenta uma oscilação entre o mundo não informatizado e aquele no qual
se encontra ciberneticamente conectado.
PORQUE
Na contemporaneidade, as verdades, mais cedo ou mais tarde, serão superadas ou, no mínimo, ressignificadas,
diante do avançar acelerado das técnicas e das tecnologias, embora esse sujeito histórico se mostre ainda
resistente em aceitá-las e vivenciá-las nos dias atuais.
Considere o texto e assinale a opção correta a respeito dessas asserções.