- A excelentíssima, declarou Seu Ribeiro, entende de escrituração.
Seu Ribeiro morava aqui, trabalhava comigo, mas não gostava de mim. Creio que não gostava de ninguém. Tudo nele se voltava para o lugarejo que se transformou em cidade e que tinha, há meio século, bolandeira, terços, candeias de azeite e adivinhações em noites de São João. Com mais de setenta anos, andava a pé, de preferência pelas veredas. E só falava ao telefone constrangido. Odiava a época em que vivia, mas tirava-se de dificuldades empregando uns modos cerimoniosos e expressões que hoje não se usam. O reduzido calor que ainda guardava servia para aquecer aqueles livros grossos, de cantos e lombadas de couro. Escrevia neles com amor lançamentos complicados, e gastava quinze minutos para abrir um título, em letras grandes e curvas, um pouco trêmulas, as iniciais cheias de enfeites.
- Entende muito, continuou. E embora eu não concorde integralmente com o método que preconiza, reconheço que poderá, querendo, encarregar-se da escrita.
- Obrigada.
- Não há de quê. A excelentíssima conhece a matéria e tem caligrafia. Eu sou uma ruína. Qualquer dia destes ...
Graciliano Ramos, São Bernardo.
Considere as seguintes comparações:
A personagem seu Ribeiro, tal como aparece no texto, e a célebre
personagem José Dias, de Dom Casmurro, de Machado de Assis,
I têm, ambas, a mania do superlativo, que empregam como modo de
compensar imaginariamente a condição subalterna e a dificuldade para
formar juízo autônomo;
II diferenciam-se, na medida em que seu Ribeiro é um empregado
assalariado, ao passo que José Dias é um agregado e, como tal,
inteiramente dependente do favor dos proprietários;
III valem-se igualmente da bajulação ou do elogio desprovido de
fundamento real e de sinceridade, como meio de alcançar as boas graças
dos proprietários.
Está correto o que se afirma em