Gosto de ovo...
Por José Carlos L. Poroca (executivo do segmento de
shopping centers).
Observem que o título está, no mínimo, comprometido, meio
sem graça. Gosto de ovos, sim – fritos ou cozidos. E fiquei
muito tempo regulando a quantidade que poderia ter
ingerido, porque havia uma ‘crença’ e uma recomendação
que ovos produziam excesso de colesterol. O que deixei de
comer (ovos) durante anos poderá fazer falta adiante e não
vou perdoar os que difundiam essa crença. Nada farei, sob o
ponto de vista do direito do consumidor. Vou apenas rogar
uma praga para os que incentivaram a economia no hábito
de comer ovos: que nasçam furúnculos nas bochechas, nas
partes internas das coxas e em outras partes do corpo.
O título correto seria “gosto de ovo e de enxofre”. O gosto do
título e da frase era para ter um acento circunflexo, acento
que foi derrubado pela “nova ortografia” – que nem é tão
nova assim. Resultado: surgem interpretações mil em cima
de uma única palavra ou de uma frase. Não havia
necessidade de mudança e, aí, vêm as perguntas: pra quê?
por quê? a troco de quê? Evidente que alguém ganhou nessa
história, não sei de que forma. Mas sei que essa mudança
continua causando confusão, sob vários aspectos.
Vejam alguns exemplos que a “revisão” trouxe: insosso – de
estar sem sal e do (a) cara que é “sem sal”; choro – tão fácil:
choro, de chorar; choro, variação do verbo chorar; pelo –
com acento, a gente sabia que havia cabelo, pelo ou
pentelho; hoje, ficamos na incerteza, porque se confundiu
com outros pelos; o doce, sem o circunflexo, ficou menos
doce, menos saboroso. Os exemplos, até por falta de
espaço, não são poucos, são inúmeros.
O título completo seria “‘gôsto’ de ovo e de enxofre”, que é o
sabor que fica na parte sensorial da minha língua, quando
leio determinados depoimentos e certas justificativas de
alguém que cometeu um erro crasso, a chamada justificativa
sem explicação, como a declaração do moço que escondeu
“money” na parte traseira do corpo e, ainda por cima, com
vestígios do material que se deposita no cofre traseiro.
Quem já nasce torto não tem jeito, morre como nasceu, ou
seja, por mais que tente, não adianta mostrar o que a
folhinha não marca. O ascendente de José Carlos “Carlinhos”
de Oliveira, Jacó (ou Jacob) do Pinto, judeu que se converteu
sob a navalha no pescoço ao catolicismo, foi visto lendo a
Bíblia de trás pra frente, no século XVII, no Recife, PE, quando
os holandeses foram expulsos pelos portugueses. Não teve
segunda chance. A chamada desculpa esfarrapada ou
justificativa inservível para corrigir o que está errado é o
mesmo que ovo podre: intragável, incomestível, mal cheiroso
e com mau gosto.
(Adaptado. Revisão linguística. Disponível em:
https://bit.ly/3oiRw6N. Acesso em 21 nov. 2020).
Leia o texto 'Gosto de ovo...' e, em seguida, analise
as afirmativas abaixo:
I. De acordo com o texto, a percepção dos brasileiros sobre a
reforma ortográfica foi pouco relevante para a decisão
acerca da manutenção do trema nas palavras
proparoxítonas.
II. No excerto “... intragável, incomestível, mal cheiroso e com
mau gosto”, a vírgula foi empregada devido a uma condição
que leva em conta fatores semânticos. É o caso semelhante
de “saiu de casa, mas não tinha vontade” e “As ondas vão e
vem, e vão, e são como o tempo” (Sereia – Lulu Santos).
III. O texto apresenta uma carga de humor que se manifesta
pelo uso da palavra “gosto” (o título completo seria “‘gôsto’ de
ovo e de enxofre”), ora forma verbal, ora substantivo. Esse é
um caso de palavras parônimas, ou seja, que apresentam
igualdade ou semelhança fonética (relativa ao som) ou são
idênticas graficamente (relativa à escrita), porém com
significados distintos.
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