As raízes do racismo
Drauzio Varella
Somos seres tribais que dividem o mundo em dois grupos:
o "nosso" e o "deles". Esse é o início de um artigo sobre racismo
publicado na revista "Science", como parte de uma seção sobre
conflitos humanos, leitura que recomendo a todos.
Tensões e suspeições intergrupais são responsáveis pela
violência entre muçulmanos e hindus, católicos e protestantes,
palestinos e judeus, brancos e negros, heterossexuais e
homossexuais, corintianos e palmeirenses.
Num experimento clássico dos anos 1950, psicólogos
americanos levaram para um acampamento adolescentes que
não se conheciam.
Ao descer do ônibus, cada participante recebeu
aleatoriamente uma camiseta de cor azul ou vermelha. A partir
desse momento, azuis e vermelhos faziam refeições em horários
diferentes, dormiam em alojamentos separados e formavam
equipes adversárias em todas as brincadeiras e práticas esportivas.
A observação precisou ser interrompida antes da data
prevista, por causa da violência na disputa de jogos e das brigas
que irrompiam entre azuis e vermelhos.
Nos anos que se seguiram, diversas experiências
semelhantes, organizadas com desconhecidos reunidos de forma
arbitrária, demonstraram que consideramos os membros de nosso
grupo mais espertos, justos, inteligentes e honestos do que os "outros".
Parte desse prejulgamento que fazemos "deles" é
inconsciente. Você se assusta quando um adolescente negro se
aproxima da janela do carro, antes de tomar consciência de que
ele é jovem e tem pele escura, porque o preconceito contra homens
negros tem raízes profundas.
Nos últimos 40 anos, surgiu vasta literatura científica para
explicar por que razão somos tão tribais. Que fatores em nosso
passado evolutivo condicionaram a necessidade de armar
coligações que não encontram justificativa na civilização moderna?
Por que tanta violência religiosa? Qual o sentido de corintianos
se amarem e odiarem palmeirenses?
Seres humanos são capazes de colaborar uns com os
outros numa escala desconhecida no reino animal, porque viver
em grupo foi essencial à adaptação de nossa espécie. Agruparse
foi a necessidade mais premente para escapar de predadores,
obter alimentos e construir abrigos seguros para criar os filhos.
A própria complexidade do cérebro humano evoluiu, pelo
menos em parte, em resposta às solicitações da vida comunitária.
Pertencer a um agrupamento social, no entanto, muitas
vezes significou destruir outros. Quando grupos antagônicos
competem por território e bens materiais, a habilidade para formar
coalizões confere vantagens logísticas capazes de assegurar maior
probabilidade de sobrevivência aos descendentes dos vencedores.
A contrapartida do altruísmo em relação aos "nossos" é
a crueldade dirigida contra os "outros".
Na violência intergrupal do passado remoto estão fincadas
as raízes dos preconceitos atuais. As interações negativas entre
nossos antepassados deram origem aos comportamentos
preconceituosos de hoje, porque no tempo deles o contato com
outros povos era tormentoso e limitado.
Foi com as navegações e a descoberta das Américas que
indivíduos de etnias diversificadas foram obrigados a conviver,
embora de forma nem sempre pacífica. Estaria nesse estranhamento
a origem das idiossincrasias contra negros e índios, por exemplo,
povos fisicamente diferentes dos colonizadores brancos.
Preconceito racial não é questão restrita ao racismo, faz
parte de um fenômeno muito mais abrangente que varia de uma
cultura para outra e que se modifica com o passar do tempo. Em
apenas uma geração, o apartheid norte-americano foi combatido
a ponto de um negro chegar à Presidência do país.
O preconceito contra "eles" cai mais pesado sobre os
homens, porque eram do sexo masculino os guerreiros que
atacavam nossos ancestrais. Na literatura, essa constatação
recebeu o nome de hipótese do guerreiro masculino.
A evolução moldou nosso medo de homens que pertencem
a outros grupos. Para nos defendermos deles, criamos fronteiras
que agrupam alguns e separam outros em obediência a critérios
de cor da pele, religião, nacionalidade, convicções políticas, dialetos
e até times de futebol.
Demarcada a linha divisória entre "nós" e "eles",
discriminamos os que estão do lado de lá. Às vezes com violência
Considere o período e as afirmações abaixo.
Estaria nesse estranhamento a origem das idiossincrasias
contra negros e índios, por exemplo, povos fisicamente
diferentes dos colonizadores brancos.
I. O uso do futuro do pretérito do verbo “estar” indica falta de
certeza quanto à origem do preconceito contra outros povos.
II. O adjetivo “idiossincrasias” pode ser substituído, sem
alteração de sentido, por agressões.
Está correto o que se afirma em