Fontes formais próprias e impróprias
Quando se fala de classificação segundo sua natureza, as fontes de direito podem ser diretas (próprias ou puras) e indiretas (impróprias e impuras).
As fontes diretas próprias ou puras, ou imediatas são aquelas cuja natureza jurídica é exclusiva de fonte, como lei, costumes e princípios gerais de direito, tendo como única finalidade servir como modo de procução do direito, incidindo qualquer dos três nas situaçãoes da vida para a concretização do justo.
Como fontes próprias pode-se citar as leis no sentido amplo ou material e as leis no sentido estrito ou formal como: constituição, emendas constitucionais, tratados internacionais, medida provisória, decreto legislativo, resolução, portaria, súmula vinculante, lei ordinária, lei complementar e lei delegada.
Já fontes indiretas, impróprias ou impuras são aquelas que assumem a função de fontes de direito por excepcionalidade, como a doutrina, a jurisprudência e os costumes. No entanto, tal característica não exclui sua finalidade de servir como método de interpretação legal.
Dimitri Dimoulis, ao tratar da jurisprudência, aponta a necessidade de distinção entre uma decisão isolada e a jurisprudência assentada.
Em relação à doutrina especificamente, entende-se que é o conjunto da produção intelectual de juristas que se empenham no conhecimento teórico do direito. No entanto, a produção de cada doutrinador pode servir a uma finalidade distinta, resultando em classificá-la como opiniões pessoais sobre a interpretação do direito em vigor[12].
Por costume, entende-se uma norma aceita como obrigatória pela consciência do povo, sem que o Poder Público a tenha estabelecido, pois constitui uma imposição da sociedade. O direito costumeiro possui dois requisitos: subjetivo e objetivo. O primeiro corresponde ao “opinio necessitatis”, a crença na obrigatoriedade, isto é, a crença que, em caso de descumprimento, incide sanção. O segundo corresponde à “diuturnidade”, isto é, a simples constância do ato.
Com relação à analogia, é possível afirmar que a sua utilização ocorre com a finalidade de integração da lei, ou seja, a aplicação de dispositivos legais relativos a casos análogos, ante a ausência de normas que regulem o caso concretamente apresentado à apreciação jurisdicional, a que se denomina anomia.
O examinador explora, na presente questão, o conhecimento do candidato acerca das previsões contidas no Código Civil e no ordenamento jurídico brasileiro. Senão vejamos:
I – O acesso a justiça está entre as grandes preocupações da sociedade contemporânea. Não se limita à simples petição ao Poder Judiciário, mas ao direito de uma pronta e efetiva resposta, em um prazo razoável, além do julgamento imparcial por um juiz ou tribunal, à observância do devido processo legal e às demais garantias processuais e constitucionais.
No mesmo sentido, leciona o civilista Pedro Manoel Abreu:
O acesso à justiça insere-se dentre as grandes preocupações da sociedade contemporânea. Na verdade, é hoje apontado como o primeiro dentre os direitos humanos. Como direito fundamental, não se limita à simples petição ao Poder Judiciário, mas ao direito de uma pronta e efetiva resposta, em um prazo razoável, além do julgamento imparcial por um juiz ou tribunal, da observância do devido processo legal e das demais garantias processuais e constitucionais. (ABREU, 2008, p. 336).
Assertiva CORRETA.
II – O acesso à Justiça apresenta finalidades básicas no sistema jurídico, pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do Estado. Citam-se como exemplos duas destas finalidades: a) o sistema deve ser igualmente acessível a todos; b) ele deve produzir resultados que sejam individual e socialmente justos.
Pautando-se na doutrina:
"A expressão “acesso à Justiça" é reconhecidamente de difícil definição, mas serve
para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico – o sistema pelo qual as
pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do
Estado que, primeiro deve ser realmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir
resultados que sejam individual e socialmente justos. (CAPPELLETTI; GARTH,
1988, p. 06)" CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988.
Assertiva CORRETA.
III – A origem primária do Direito está relacionada diretamente com suas fontes. Estas fontes podem ser: materiais ou formais.
"Fonte jurídica" seria a origem primária do direito, confundindo-se com o problema da gênese do direito. Trata-se da fonte real ou material do direito, ou seja, dos fatores reais que condicionaram o aparecimento da norma jurídica." SAMPAIO, Nelson de Souza. Fontes do direito-II. Enciclopédia Saraiva do direito, pp. 51 e 53.
"O jurista deve ater-se tanto às fontes materiais como às formais, preconizando a supressão da distinção, preferindo falar em fonte formal-material, já que toda fonte formal contém, de modo implícito, uma valoração, que só pode ser compreendida como fonte do direito no sentido de fonte material. Além disso, a fonte material ou real aponta a origem do direito, configurando a sua gênese, daí ser fonte de produção, aludindo a fatores éticos, sociológicos, históricos, políticos, etc., que produzem o direito, condicionam o seu desenvolvimento e determinam o conteúdo das normas. A fonte formal lhe dá forma, fazendo referência aos modos de manifestação das normas jurídicas, demonstrando quais os meios empregados pelo jurista para conhecer o direito, ao indicar os documentos que revelam o direito vigente, possibilitando sua aplicação a casos concretos, apresentando-se, portanto, como fonte de cognição. As fontes formais são os modos de manifestação do direito mediante os quais o jurista conhece e descreve o fenômeno jurídico. O órgão aplicador, por sua vez, também recorre a elas, invocando-as como justificação da sua norma individual." COELHO, Luiz Fernando. Fonte de produção e fonte de cognição. Enciclopédia Saraiva do direito, pp. 39 e 40; FRANÇA, Rubens Limongi. Formas e aplicação do direito positivo, p. 32; TORRÉ, Abelardo. Introducción al derecho, pp. 274-279; MÁYNEZ, Eduardo Garcia. Introducción al estúdio del derecho, p. 51; REALE, Miguel. Lições preliminares de direito, p. 154.
Assertiva CORRETA.
IV – Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum. Neste contexto, a ciência do direito, articulada no modelo teórico hermenêutico apresenta, especialmente, as tarefas de: a) interpretar as normas; b) verificar a existência da lacuna jurídica; c) afastar contradições normativas.
Estabelece o artigo 5° da LINDB:
Art. 5º. Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
E ainda, a doutrina acerca do tema:
"A ciência do direito, como atividade interpretativa, surge como uma teoria hermenêutica, por ter dentre outras funções, as de:
a) interpretação das normas, que compreende múltiplas possibilidades técnicas interpretativas, dando ao intérprete a liberdade jurídica na escolha destas vias, buscando sempre condições para uma decisão possível, baseada em uma interpretação e um sentido preponderante dentre às várias possibilidades interpretativas; b) verificar a existência da lacuna jurídica, identificando a mesma e apontando os instrumentos integradores que possibilitem uma decisão possível mais favorável, com base no direito; c) afastar contradições normativas através da indicação de critérios para solucioná-las.
De acordo com Maria Helena Diniz, "a ciência jurídica exerce funções relevantes, não só para o estudo do direito, mas também para a aplicação jurídica, viabilizando-o como elemento de controle do comportamento humano ao permitir a flexibilidade interpretativa das normas, autorizada pelo art. 5º da Lei de Introdução, e ao propiciar, por suas criações teóricas, a adequação das normas no momento de sua aplicação." Diniz, Maria Helena. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 145.
Assim, ao interpretar a norma, o intérprete deve levar em conta o coeficiente axiológico e social nela contido, baseado no momento histórico que está vivendo, já que a norma geral em si deixa em aberto várias possibilidades, deixando esta decisão a um ato de produção normativa, sem esquecer que, ao aplicar a norma ao caso concreto, deve fazê-lo atendendo à sua finalidade social e ao bem comum.
Em relação ao fim social, a mesma autora afirma que: “pode se dizer que não há norma jurídica que não deva sua origem a um fim, um propósito ou um motivo prático, que consistem em produzir, na realidade social, determinados efeitos que são desejados por serem valiosos, justos, convenientes, adequados à subsistência de uma sociedade, oportunos, etc". Diniz, Maria Helena. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 171.
Tércio Sampaio Ferraz Júnior, observa que os fins sociais são do direito, já que a ordem jurídica como um todo, é um conjunto de normas para tornar possível a sociabilidade humana; logo dever-se-á encontrar nas normas o seu fim (telos), que não poderá ser anti-social.
Na prática, o intérprete-aplicador deverá, em cada caso sub judice, verificar se a norma atende à finalidade social, devendo ser interpretada inserida no próprio meio social em que está presente, já que imersa nele e conseqüentemente sob constante simbiose com o mesmo, adaptando-a às necessidades sociais existentes no momento de sua aplicação.
Dessa forma, recebendo continuamente vida e inspiração do meio ambiente, a aplicação da lei seguirá a marcha dos fenômenos sociais, estando apta a produzir a maior soma possível de energia jurídica.
No que tange ao bem comum, sua noção é bastante complexa e composta de inúmeros elementos ou fatores. De qualquer forma, são reconhecidos comumente como elementos do bem comum a liberdade, a paz, a justiça, a utilidade social, a solidariedade ou cooperação, não resultando o bem comum da simples justaposição destes elementos, mas de sua harmonização face à realidade sociológica.
Não há consonância na doutrina sobre a importância atribuída a esses elementos, mas de qualquer forma entende-se que ao aplicar norma, decidindo o fato, é dever de seu intérprete-aplicador estar atento ao fato de que as exigências do bem comum estejam ligadas ao respeito dos direitos individuais garantidos pela Constituição.
Sendo assim, percebe-se que todo o ato interpretativo deve estar baseado na concreção de determinado valor positivo ou objetivo, objetivo este fundado no bem comum, respeitando assim o indivíduo e a coletividade." LICC Comentada, por Fernanda Piva.
Assertiva CORRETA.
V – A hermenêutica é a arte de interpretar. Contudo, não contém regras bem ordenadas quando da fixação de princípios e critérios para interpretação. Pode-se afirmar que a hermenêutica se esgota no campo da interpretação jurídica, por ser apenas um instrumento para sua realização.
Pela doutrina, se extrai:
Assertiva incorreta.
A) Apenas as assertivas I, II, III e IV estão corretas.
B) Apenas as assertivas II, III e IV estão corretas.
C) Apenas as assertivas I, III e V estão corretas.
D) Apenas as assertivas I, II e IV estão corretas.
E) Todas as assertivas estão corretas.
Gabarito do Professor: A
Bibliografia:
ABREU, Pedro Manoel. O processo jurisdicional como um locus da democracia da
democracia participativa e da cidadania inclusiva. 2008. 544 f. Tese (Doutorado em
Direito) – Centro de Ciências Jurídicas. Universidade Federal de Santa Catarina:
Florianópolis, 2008.
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988.
COELHO, Luiz Fernando. Fonte de produção e fonte de cognição. Enciclopédia Saraiva do direito, pp. 39 e 40; FRANÇA, Rubens Limongi. Formas e aplicação do direito positivo, p. 32; TORRÉ, Abelardo. Introducción al derecho, pp. 274-279; MÁYNEZ, Eduardo Garcia. Introducción al estúdio del derecho, p. 51; REALE, Miguel. Lições preliminares de direito, p. 154.
DINIZ, Maria Helena. Ob. cit., p.68; Ferrara. Trattato, cit., p. 189-91; Batalha, Wilson de S. Campos Batalha. Lei de Introdução ao Código Civil, São Paulo: Max Limonad, v.1
FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito, São Paulo: Atlas, p.265.
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil; parte geral. São Paulo: Saraiva, 1967, v.1, p.43; Bevilácqua, Clóvis. Teoria geral do direito, 4.ed. Ministério da Justiça, 1942, p.59.
SAMPAIO, Nelson de Souza. Fontes do direito-II. Enciclopédia Saraiva do direito, pp. 51 e 53.