A questão trata da teoria da imprevisão.
Deve-se entender que o fator onerosidade, a
fundamentar a revisão ou mesmo a resolução do contrato, não necessita da prova
de que uma das partes auferiu vantagens, bastando a prova do prejuízo e do
desequilíbrio negocial. Nesse sentido, foi aprovado na IV
Jornada de Direito Civil o Enunciado n. 365 CJF/STJ, que prevê que “a extrema vantagem do art. 478 deve ser interpretada como
elemento acidental da alteração de circunstâncias, que comporta a incidência da
resolução ou revisão do negócio por onerosidade excessiva, independentemente de
sua demonstração plena”.
Por fim, entra em cena o fator imprevisibilidade,
que tanto suscita dúvidas e debates. No presente capítulo foi demonstrado que,
para a aplicação da revisão por imprevisibilidade, há a necessidade de comprovação
dessas alterações da realidade, ao lado da ocorrência de um fato imprevisível
e/ou extraordinário, sem os quais não há como invocá-la. O pressuposto é, portanto,
que o contrato deve ser cumprido enquanto se conservarem imutáveis as condições
externas. Havendo alterações das circunstâncias, modifica-se a execução,
tentando restabelecer-se o status quo ante. (Tartuce, Flávio. Direito Civil: teoria geral dos contratos e
contratos em espécie – v. 3. – 14. ed. –
Rio de Janeiro: Forense, 2019. P. 269)
Voltando ao tema central deste capítulo, apesar do conhecimento pacífico
e da aceitação da revisão contratual por fato superveniente, infelizmente
poucos casos vêm sendo enquadrados como imprevisíveis por nossos Tribunais,
realidade que se esperava mudar com o advento do Código Civil de 2002. Isso
porque a jurisprudência nacional sempre considerou o fato imprevisto tendo como
parâmetro o mercado, o meio que envolve o contrato, não a parte contratante. A
partir dessa análise, em termos econômicos, na sociedade pós-moderna
globalizada, nada é imprevisto, tudo se tornou previsível. Não seriam imprevisíveis
a escala inflacionária, o aumento do dólar ou o desemprego, não sendo possível
a revisão contratual motivada por tais ocorrências. A título exemplificativo,
veja-se antiga decisão do STJ:
“Civil. Teoria da Imprevisão. A Escalada Inflacionária não é
um fator imprevisível, tanto mais quando avençada pelas partes a incidência de
Correção Monetária precedentes. Recurso não conhecido”
(STJ, REsp 87.226/DF (9600074062), 3.ª Turma, Rel. Min.
Costa Leite, Decisão: por unanimidade, não conhecer do Recurso Especial, j.
21.05.1996, DJ 05.08.1996, p. 26.352. Veja: AgA 12.795/RJ, AgA 51.186/SP, AgA
58.430/SP).
Esse tipo de interpretação, na verdade, torna praticamente impossível
rever um contrato por fato superveniente a partir do Código Civil de 2002,
retirando a efetividade do princípio da função social dos contratos e da boa-fé
objetiva, normalmente utilizados como fundamentos para a revisão contratual. (Tartuce, Flávio.
Direito Civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie – v. 3. – 14. ed. – Rio de Janeiro: Forense,
2019. P. 272/273)
DIREITO
CIVIL. MAXIDESVALORIZAÇÃO DO REAL EM FACE DO DÓLAR AMERICANO E TEORIAS DA
IMPREVISÃO E DA ONEROSIDADE EXCESSIVA.
Tratando-se de relação contratual paritária - a
qual não é regida pelas normas consumeristas -, a maxidesvalorização do real em
face do dólar americano ocorrida a partir de janeiro de 1999 não autoriza a
aplicação da teoria da imprevisão ou da teoria da onerosidade excessiva, com
intuito de promover a revisão de cláusula de indexação ao dólar americano. Com efeito, na relação
contratual, a regra é a observância do princípio pacta sunt servanda,
segundo o qual o contrato faz lei entre as partes e, por conseguinte, impõe ao
Estado o dever de não intervir nas relações privadas. Ademais, o princípio da
autonomia da vontade confere aos contratantes ampla liberdade para estipular o
que lhes convenha, desde que preservada a moral, a ordem pública e os bons
costumes, valores que não podem ser derrogados pelas partes. Desse modo, a
intervenção do Poder Judiciário nos contratos, à luz da teoria da imprevisão ou
da teoria da onerosidade excessiva, exige a demonstração de mudanças
supervenientes das circunstâncias iniciais vigentes à época da realização do
negócio, oriundas de evento imprevisível (teoria da imprevisão) e de evento
imprevisível e extraordinário (teoria da onerosidade excessiva), que
comprometam o valor da prestação, demandando tutela jurisdicional específica,
tendo em vista, em especial, o disposto nos arts. 317, 478 e 479 do CC. Nesse
passo, constitui pressuposto da aplicação das referidas teorias, a teor dos
arts. 317 e 478 do CC, como se pode extrair de suas próprias denominações, a
existência de um fato imprevisível em contrato de execução diferida, que
imponha consequências indesejáveis e onerosas para um dos contratantes. A par
disso, o histórico inflacionário e as sucessivas modificações no padrão
monetário experimentados pelo País desde longa data até julho de 1994, quando
sobreveio o Plano Real, seguido de período de relativa estabilidade até a maxidesvalorização
do real em face do dólar, ocorrida a partir de janeiro de 1999, não autorizam
concluir pela inexistência de risco objetivo nos contratos firmados com base na
cotação da moeda norte-americana, em se tratando de relação contratual paritária.
REsp
1.321.614-SP, Rel.
originário Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para acórdão Min. Ricardo
Villas Bôas Cueva, julgado em 16/12/2014, DJe 3/3/2015. Informativo 556 do STJ.
A) não terei sucesso, porque embora a ausência de reajuste salarial e o índice
de inflação caracterizem fatos extraordinários e imprevisíveis, não houve
manifesta vantagem para o credor.
Não terei sucesso, pois a ausência de reajuste salarial e o percentual
inflacionário do período não podem servir de fundamento para aplicação da
teoria da imprevisão, não se tratando de acontecimentos extraordinários e
imprevisíveis e não se configurando extrema vantagem para o credor.
Incorreta
letra “A”.
B) terei sucesso, pois a união dos dois acontecimentos, ausência de reajuste
salarial e índice de inflação do período, caracterizam fatos extraordinários e
imprevisíveis, enquadrando-se na teoria da imprevisão.
Não terei
sucesso, pois a ausência de reajuste salarial e o percentual inflacionário do
período não podem servir de fundamento para aplicação da teoria da imprevisão,
não se tratando de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis e não se
configurando extrema vantagem para o credor.
Incorreta
letra “B”.
C) terei sucesso, pois a análise geral dos fatos caracterizará abuso do direito
em favor do credor, com prejuízo indevido para mim enquanto devedor.
Não terei sucesso, pois a ausência de reajuste salarial e o percentual
inflacionário do período não podem servir de fundamento para aplicação da
teoria da imprevisão, não se tratando de acontecimentos extraordinários e
imprevisíveis e não se configurando extrema vantagem para o credor.
Incorreta
letra “C”.
D) não terei sucesso, pois a ausência de reajuste salarial e o percentual
inflacionário do período não podem servir de fundamento para aplicação da
teoria da imprevisão, não se tratando de acontecimentos extraordinários e
imprevisíveis e não se configurando extrema vantagem para o credor.
Não terei
sucesso, pois a ausência de reajuste salarial e o percentual inflacionário do
período não podem servir de fundamento para aplicação da teoria da imprevisão,
não se tratando de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis e não se
configurando extrema vantagem para o credor.
Correta
letra “D”. Gabarito da questão.
E) terei sucesso se completar pelo menos um ano da aquisição, que é condição
essencial para aplicação da teoria da imprevisão no tempo.
Não terei sucesso, pois a ausência de reajuste salarial e o percentual
inflacionário do período não podem servir de fundamento para aplicação da
teoria da imprevisão, não se tratando de acontecimentos extraordinários e
imprevisíveis e não se configurando extrema vantagem para o credor.
Incorreta
letra “E”.
Resposta: D
Gabarito do Professor letra D.
Sobre a aplicabilidade do Código de Defesa do
Consumidor:
Informativo 556 do STJ:
DIREITO
CIVIL E DO CONSUMIDOR. HIPÓTESE DE INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA BASE OBJETIVA
OU DA BASE DO NEGÓCIO JURÍDICO.
A teoria da base objetiva ou da base do negócio
jurídico tem sua aplicação restrita às relações jurídicas de consumo, não sendo
aplicável às contratuais puramente civis. A teoria da base objetiva difere da teoria da
imprevisão por prescindir da imprevisibilidade de fato que determine oneração
excessiva de um dos contratantes. Pela leitura do art. 6°, V, do CDC, basta a
superveniência de fato que determine desequilíbrio na relação contratual
diferida ou continuada para que seja possível a postulação de sua revisão ou
resolução, em virtude da incidência da teoria da base objetiva. O requisito de
o fato não ser previsível nem extraordinário não é exigido para a teoria da
base objetiva, mas tão somente a modificação nas circunstâncias indispensáveis
que existiam no momento da celebração do negócio, ensejando onerosidade ou
desproporção para uma das partes. Com efeito, a teoria da base objetiva tem por
pressuposto a premissa de que a celebração de um contrato ocorre mediante
consideração de determinadas circunstâncias, as quais, se modificadas no curso
da relação contratual, determinam, por sua vez, consequências diversas daquelas
inicialmente estabelecidas, com repercussão direta no equilíbrio das obrigações
pactuadas. Nesse contexto, a intervenção judicial se daria nos casos em que o
contrato fosse atingido por fatos que comprometessem as circunstâncias
intrínsecas à formulação do vínculo contratual, ou seja, sua base objetiva. Em
que pese sua relevante inovação, a referida teoria, ao dispensar, em especial,
o requisito de imprevisibilidade, foi acolhida em nosso ordenamento apenas para
as relações de consumo, que demandam especial proteção. Ademais, não se admite
a aplicação da teoria do diálogo das fontes para estender a todo direito das
obrigações regra incidente apenas no microssistema do direito do consumidor. De
outro modo, a teoria da quebra da base objetiva poderia ser invocada para
revisão ou resolução de qualquer contrato no qual haja modificação das
circunstâncias iniciais, ainda que previsíveis, comprometendo em especial o
princípio pacta sunt servanda e, por conseguinte, a segurança jurídica.
Por fim, destaque-se que, no tocante às relações contratuais puramente civis,
quer dizer, ao desamparo das normas protetivas do CDC, a adoção da teoria da
base objetiva, a fim de determinar a revisão de contratos, poderia, em
decorrência da autuação jurisdicional, impor indesejáveis prejuízos reversos
àquele que teria, em tese, algum benefício com a superveniência de fatos que
atinjam a base do negócio. REsp
1.321.614-SP, Rel.
originário Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para acórdão Min. Ricardo
Villas Bôas Cueva, julgado em 16/12/2014, DJe 3/3/2015.